18.10.14

A bolsa família da classe média



Sou leitor bissexto do blog Tijolaço, herdeiro da coluna jornalística mantida durante muito tempo por Leonel Brizola.
Textos críticos e elucidativos tem a boa prática do jornalismo de opinião calcado em fatos e dados, sempre passíveis de verificação.
O texto que a amiga Carol Garcia me enviou, da lavra do Tijolaço, é formidável.
Desnuda as Bolsas Famílias que nós, da chamada classe média e até mesmo os ricos, recebemos costumeiramente e não nos ofendemos, além de exigirmos sempre mais.
Para que todos possam usufruir do texto reproduzo-o na íntegra:

Nós ganhamos Bolsa-Família todo ano… Muito maior, e ninguém me xinga

Recebo um e-mail do Ângelo, um camarada que não vejo há uns 30 anos, mas que foi um dos envolvidos  na primeira “manifestação subversiva ” que vi e entendi, depois de uns “tios” estranhos que passaram uns dias lá por casa logo após o golpe de 64.
Ângelo, seus irmãos – filhos do velho Alberto, um homem admirável – e outros moleques se revoltaram quando os outros moradores de um conjunto de prédios  modestos na Rua Cabuçu, no Lins de Vasconcelos, subúrbio do Rio, decidiram fazer muros em volta dos edifícios, separando a garotada que crescia junto e junto fazia suas traquinagens.
E picharam os muros novinhos: “vocês estão ficando ricos?” “Pensam que a gente é vaca para botar em curral?”
Pois o Ângelo, neste e-mail, chama-me a atenção para algo que nunca vi ninguém dizer, embora obvio.
Que nós, classe-média – e também os ricos – também ganhamos um bolsa família do Governo, bem maior que o dos pobres…
Pois não é que descontamos, por cada dependente, neste ano de 2014, exatos R$ 2.156,52 no imposto de renda, por ano?
Isso mesmo, R$ 179,71 mensais.
Esta lá, na tabela da Receita Federal.
Portanto, é dinheiro que a gente deixa de pagar de imposto e que se soma às nossas disponibilidades, como diz o Ângelo, para comprarmos o que quisermos, do feijão até bebidas e artigos supérfluos.  Ninguém tem nada com isso e os R$ 179, 71  contam para cada filho, não importa se eu tenha um ou 18 bacuris.
Seria dinheiro do Governo e passa a ser meu, seu, nosso.
Mas os pobres do Bolsa-Família só levam R$ 35 por rebento, ou R$ 42, se forem adolescentes.
Com um máximo de cinco semoventes miúdos, aliás.
Somando com o benefício básico, de R$ 77,  não dá nem R$ 300 reais por mês, ou mais um pouco, se tiver criança pequena, etc…
Menos do que eu descontaria com dois filhos, só.
Mas eu também ganhei – e muitos ganham – também o “Bolsa-Escola”, porque podemos abater  mais  R$ 3.230,46 por ano com escola particular por cada filho, ou mais R$ 270 por filho estudando, sem limite de filhos.
Por filho, note bem.
Nem falamos no plano de saúde, aliás.
E aí, diz o Ângelo, eu posso beber umas e outras com essa grana que deixo de pagar de imposto, e ninguém tem nada com isso.
Ninguém nos xinga por isso.
Ninguém diz que a gente se enche de filhos para ficar com mais dinheiro, em vez de recolher impostos.
Ninguém nos chama de vagabundos, de inúteis, de parasitas.
Mas diz dos pobres.
Como pergunta o meu amigo de tempos “imemoriais”: “Quer dizer que bolsa família pra bacana pode, pobre é que é vagabundo e não pode receber?”
Ângelo, você não se corrige, daqui a pouco vai querer pichar uns muros na Rua Cabuçu.
Se me chamar, eu vou com você.
Fonte: http://tijolaco.com.br/blog/?p=22172

Um comentário:

Renato Couto disse...

Ponto de vista genial, que nos leva a reflexões maiores sobre nossa tributação.