9.5.23

Aílton Nunes Júnior

 O amigo Ailton, companheiro dos tempos de USP, de quando me apaixonei por estudar a educação, se foi.

Deixou saudades e, de certa forma, uma grande interrogação: como assim?

Vao fazer uma falta danada

Segue texto do Tarcisio, que escreve lá do sul da Bahia, sobre esse companheiro que se foi. 


O crítico…

Parece fácil um apelido pegar, mas difícil é ele pegar e ao mesmo tempo sincronizar com o perfil da pessoa. Aqui no sul da Bahia os que pegam, são justamente aqueles que a pessoa não gosta!! Mas neste caso nosso amigo Osvaldo Camilo acertou em cheio: “O Ailton é muito crítico!”…

A criticidade é, antes de mais nada, um elemento essencial a produtividade, qualidade e outros, então não vamos confundir, de antemão, o sujeito crítico com o sujeito problemático. Mas ele não perdoava, em seus ácidos comentários, a ninguém: da executiva nacional de estudantes aos próprios professores doutores da faculdade. E caso você que ache que não cabe críticas aos professores universitários eu sei bem as dificuldades hercúleas para trocar copos descartáveis por xícaras definitivas, junto aos titulares e livre-docentes da faculdade de educação.

E sobrou até pra mim, julgado como o “redundante” por ele. Bom, fazem bem uns vinte anos que ele disse isso e, se até hoje não me esqueci, é porque serviu para me policiar a todo tempo sobre a arte de escutar melhor antes de sair falando, ou a “escutatória” como diria Rubem Alves.

Mas ele sempre complementava os seus comentários com aquele bordão que buscava suavizar a crítica: “é uma figura complicada”… Que figura era ele também. Nunca foi assíduo em nossos rolês de happy hour ou escapadas no bar porque costumava dizer: “não é minha turma”. E qual era a turma dele? Quem sabe… Tinha amigos em todos os cantos, mas espalhados, pois frequentava a faculdade há tempos… Fora o famoso Jorge, não se sabe muito sobre sua galera, mas o fato é que ele não se encaixava em turmas, tribos e movimentos. O lobo solitário só foi agregado a turma com a vivência no NEA que envolveu muita gente, inclusive nós do 505D.

Aliás, foi no 505 que os papos rolavam noite a dentro… Sem ter como voltar a casa na zona leste, restava a ele o “sofá” da sala para dormir, em meio aos perrengues da moradia estudantil. Questionávamos todas as mazelas da universidade e o embate teórico, versava sobre tudo. Até me vendeu um carro que era dele com o irmão e passei então a me esconder, porque ter carro e vaga na moradia, à época, eram coisas incompatíveis na cabeça de muitos, até de alguns que coordenavam o processo… A falta de consciência de classe já fazia vítimas desde aqueles tempos!

E por falar em consciência de classe, éramos todos vindos da periferia da cidade eu, ele e Ney e desta clareza que tínhamos, as nossas conversas sempre foram construtivas e auxiliaram o entendimento das desigualdades e da importância da universidade pública. Que figura!!

Mais um fato ainda lembro: foi ele que me acordou de madrugada, certa vez, para dizer que nosso colega de quarto, Flávio, estava em crise de epilepsia. Debati-me alguns instantes até ele retomar a consciência e eu terminar com o rosto cheio de sangue. Depois do ocorrido ele passou a me considerar mais.

Aquele apê tem muitas histórias, Ailton foi uma delas, com sua fixação por cabelos e seu famoso rabo de cavalo… Chegou a virar resenha nas palavras das cursistas de Alagoas, no programa alfabetização solidária.

Bem, agora que ele se foi. e precocemente, deixo cá essas lembranças das milhares de desventuras que a universidade nos impõe e a forma de cativar de Ailton, o crítico!!!

 

Aperto na mente!

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