23.10.11

Caco Barcelos e o bom jornalismo

Caco Barcelos é genial! Ele não combina com a Globo, sempre que posso vejo Profissão Repórter. Vejam a aula de jornalismo que ele dá num programa da Globo News:

14.10.11

Não suporto o horário de verão

Inferno!
Santo desconforto! Será que isso compensa mesmo?
Tenho minhas dúvidas quanto à eficácia dessa mudança de horário.
Segundo li no portal Terra (é só clicar aqui para ler também), o horário de verão pode reduzir a produtividade, além de causar outros males, a depender do indivíduo. Alguém já mediu o custo disso?
Segundo nos informa a Wikipédia a ideia brilhante foi de Benjamin Franklin em 1784, mas não conseguiu convencer ninguém da utilidade da proposta – ressalte-se que nem mesmo existia luz elétrica.
Já a Divisão Serviço de Hora nos diz que a ideia foi do britânico William Willett em 1907.
Com todo respeito a ambos, deveriam ter ficado quietos!
Ainda segundo a mesma fonte, o primeiro país a usar do artifício foi a Alemanha durante a 1ª Guerra Mundial, tendo em seguida espalhado a “moda” para a Europa.
No Brasil o horário de verão foi utilizado pela primeira vez em 1931 e, pasmem, aplicado em todo o território nacional, mesmo naquela vasta porção que fica próxima a linha do Equador, portanto com ótima iluminação solar durante todo o ano.
Os defensores desse horário dos domínios das trevas usam argumentos como estes:
- 1% de economia de energia
- EUA e Europa também se utilizam
- redução significativa de consumo no horário de pico
Então por partes:
- será que os prejuízos (produtividade, acidentes de trânsitos, transtornos de saúde etc.) não são maiores do que este 1%?
- EUA e Europa estão fora da Zona Intertropical, portanto a diferença de insolação é substancialmente maior do que no nosso país, tal comparação não se justifica.
- se assim é, então por que não mudamos os horários dos diversos setores de atividade urbana, como comércio, banco, indústria etc., fazendo com haja um “descongestionamento” do tal horário de pico? Isso para sempre, e não apenas no horário de verão.
Eu não suporto tal mudança. Mais de um mês para entrar no ritmo novo e, assim que me acostumo, já está na hora de voltar ao ritmo antigo!
Além do tal horário de verão começar em plena primavera...

PS: esse texto foi publicado em 18.10.09.

11.10.11

Liberdade de expressão: valor inquestionável para o exercício da cidadania

Vagarosamente vamos-nos acostumando a democracia.
Um valor inquestionável para as práticas democráticas – e, principalmente, para o exercício da plena cidadania – é a liberdade de expressão.
Na Constituição de 1988 está escrito (Dos Direitos e Garantias Fundamentais – CAPÍTULO I – DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS):
“IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;”
Hoje presenciamos na mídia uma série de questionamentos quanto aos limites para esta liberdade – impostos por lei ou exigidos por parcela da sociedade para as tais liberdades.
No tocante a questão legal salta aos olhos o impedimento imposto ao jornal O Estado de São Paulo de mencionar as investigações que envolvem a família Sarney. De maneira equivocada o jornal trata o episódio como censura. É uma restrição jurídica.
Com relação às manifestações da sociedade sobre tais limites temos dois casos que considero emblemáticos: o episódio envolvendo Rafinha Bastos e a regulamentação da mídia.
Vamos tratá-los separadamente.
Rafinha Bastos, integrante da trupe que executa o tal stand up comedy – e tratam disso como se tivessem inventado a roda – foi extremamente grosseiro num comentário sobre a gravidez da cantora Wanessa Camargo (clique aqui para ver e ouvir a preciosidade). Aliás, foi apenas mais uma grosseria, dentre as várias outras cometidas por este moço, seja em rede nacional, no programa de TV ou nos seus shows. Piadas de cunho nazifacistóide são comuns no seu repertório.
Só que desta vez ele mexeu com a “minoria” errada: ricos e famosos com poder comercial na TV.
Marcus Buaiz, marido de Wanessa e sócio do Ronaldo Fenômeno, intercedeu junto à emissora de TV que emprega o boçal. Até o momento a notícia que corre é que ele se encontra afastado do programa.
Observem que o afastamento não se dá por conta da piada de mau gosto cometida pelo infante, mas sim pelo alvo que ele escolheu. Tal alvo tem poder de fogo na mídia e por isso o escarcéu.
Programas de TV como o CQC me irritam profundamente. Ora são humoristas, fazendo piadas, ora são jornalistas trabalhando com informação. A versão varia de acordo com a conveniência.
Por essas e outras, se faz necessário uma regulamentação para o funcionamento da mídia. Não é censura, é limite para o poder que a mídia tem, de maneira a garantir justiça e equidade no tratamento dos indivíduos em todos os órgãos de imprensa.
Os dispositivos constitucionais não foram suficientemente regulamentados, permanecem várias lacunas.
Basta lembrar o caso da Escola Base em São Paulo. Vidas foram destruídas, reputações destroçadas e negado o direito ao trabalho a partir da ação inconseqüente de uma autoridade – um delegado – e a divulgação feita pela TV, Rádio, Jornal e Revistas, do episódio. Para recordar o fato clique aqui.
Poderia listar vários outros exemplos, inclusive no campo da manipulação política, como foi o caso da edição do debate entre Collor e Lula na TV Globo nas eleições de 1989. Clique aqui para lembrar.
Ou ainda os artigos que pipocaram na mídia – com particular destaque para a Folha de S.Paulo e a sua colunista Eliane Catanhede – anunciando bombasticamente uma epidemia de febre amarela no país e sugerindo que as pessoas corressem ao posto de saúde mais próximo para se vacinar. Leia aqui sobre isso.
A punição no primeiro caso – Escola Base – demorou décadas. Os envolvidos pagam caro até hoje pela irresponsabilidade da mídia nativa.
Não vou nem falar da revista Veja, mas vejam aqui capas “brilhantes” desta semanal, que transforma mentira e fofoca em jornalismo.
Precisamos de intervenções legais para garantir a isonomia na liberdade de expressão, além de fazer com que descalabros como estes mencionados sejam seriamente apenados, inclusive com indenizações pesadíssimas, similares aquelas praticadas na imprensa europeia ou estadunidense.
Devem ser punidos os veículos e os executores, os profissionais não podem ficar impunes, alegando estrito cumprimento do dever e respeito à hierarquia. Tal argumento não colou nos tribunais argentinos, quando os oficiais de baixa patente tentaram usá-lo para safar-se das punições pelos crimes cometidos na ditadura.

3.10.11

Nosso racismo quer ser suave

Caros amigos e amigas – que acompanham meus textos e indicações de leituras – peço-lhes licença para republicar aqui uma postagem copiada do Vi o Mundo, que buscou no blog Maria Frô. Ela é imensa para os padrões blogueiros, mas necessário que assim seja.
Ainda hoje conversava com um grupo de alunos da 2ª Série do EM sobre a política de cotas e outras políticas afirmativas.
Falei-lhes sobre autores que cometem livros para “provar” que não existe racismo no Brasil.
Nosso racismo é mais dissimulado do que o dos outros, mas mata!
Leiam o que segue e digam-me se não é para sentirmos vergonha!



As duas mortes do Toni

Por João Negrão, especial para o Maria Frô, no blog da Conceição Oliveira

26/09/2011

Quarta-feira, 21 de setembro de 2011, 19 horas, em Jackson, capital do estado da Geórgia, Estados Unidos, Troy Davis, um negro de 42 anos, recebeu a dose letal que o levaria à morte. Condenado por assassinato, Troy Davis deitou-se na maca para receber as injeções repetindo a mesma frase de 22 anos antes, quando foi preso e condenado: “Sou inocente”.
Quinta-feira, 22 de setembro de 2011, por volta das 23 horas, em Cuiabá, capital do estado de Mato Grosso, Brasil, Tony Bernardo da Silva, um negro de 27 anos, africano de Guiné-Bissau, estudante de Economia da Universidade Federal, recebeu um pontapé na traquéia e morreu. O golpe culmina uma sessão de socos e pontapés desferidos por dois policiais e um empresário que duraria em torno de 15 minutos.
Impossível não traçar um paralelo entre as duas mortes.
A primeira foi uma condenação legal, nos moldes da justiça norte-americana, que todos conhecemos, empenhada a condenar negros, ainda que, como é o caso de Troy, haja evidências de inocência. Inclusive depoimento de outro preso assumindo a autoria do crime atribuído a ele. Em vão: Troy não recebeu perdão, não teve a clemência do governador da Geórgia e muito menos direito a recurso na Suprema Corte, dado às evidências de sua inocência.
Difícil não imaginar que se trata de mais um caso de racismo como os que pontuam a crueldade do sistema jurídico e a sociedade racista dos Estados Unidos, especialmente nos estados sulistas como a Geórgia.
Como é difícil não suspeitar que o caso do Toni foi uma expressão pura e cabal de racismo.
Uma condenação prévia: um negro que adentra a uma pizzaria freqüentada por rapagões e moçoilas de classe média alta de Cuiabá, num bairro idem, embora predominantemente de repúblicas estudantis (o Boa Esperança fica ao lado do campus da UFMT) é um bandido. E ainda mais se este negro acidentalmente esbarra na namorada de um desses fregueses.
Afinal, aquele não é um lugar para negros. Pior ainda. Que atrevimento! Um negro que deveria estar na senzala não pode adentrar a uma casa grande dos pequenos burgueses e tocar a mulher branca do sinhozinho.
Então, eis seu crime. E está decretada a pena de morte. Não se sabe se os policiais e o empresário (sinhozinho) estavam armados. Se estivessem teriam desferido vários tiros?  Tenho dúvida. Não sei se não preferiram mesmo usar como instrumentos de execução os socos e pontapés. Afinal, esta na moda uma das marcas da intolerância: matar a porradas negros, homossexuais e todos que esses “bad boys” não toleram por serem diferentes deles, supostamente bem nascidos, bem nutridos e crentes da impunidade. E com um ingrediente macabro: eles se divertem.  E não raras vezes filmam e jogam em suas redes sociais.
Seguindo o mesmo “modelito” que a imprensa em geral aplica a esses casos, todos ciosos a dar voz e vez aos assassinos da elite, tentam desqualificar o morto. Versões diversas surgem por todos lados dando conta que ele tinha passagens pela polícia, era drogado, perdeu a vaga no convênio da UFMT e outras informações nefastas. Como sempre trabalham com meias-verdades, com deturpações dos fatos e a omissão de outros.
Essas versões são disseminadas por advogados e familiares dos assassinos, que encontram voz em veículos de comunicação que, deliberadamente ou não, as propagam sem questionar o contexto da vida do Toni e os depoimentos de amigos, colegas e ex-namorada, todos, unanimemente, testemunhando sua conduta passível e respeitadora.
É compreensível que os advogados e familiares tomem tal atitude. Mas não justifica a postura dos representantes da Universidade Federal de Mato Grosso, que qualificaram o Toni como um indivíduo de má conduta.
O setor da UFMT responsável pelo convênio entre o governo brasileiro e os governos dos países africanos de língua portuguesa, que permitem jovens daqueles países estudarem no Brasil, sempre foi omisso e racista com esses estudantes. Poderia desfilar aqui uma série de descasos, dificuldades criadas e declarações preconceituosas. Não é o caso agora.
Por enquanto fica o registro de que o Toni sempre buscou desesperadamente lutar contra o vício do crack e encontrou pouco apoio na UFMT. Seus amigos se mobilizaram, igualmente seus colegas e professores. Mas a instituição se agarrou na burocracia. Por ele não conseguir mais freqüentar as aulas, o desligaram do convênio, pura e simplesmente. E ficou por isso. Contudo não pouparam declarações cruéis, insensíveis e até irresponsáveis na imprensa.
Esta é a mesma instituição que ignora que drogas como o crack estão se proliferando dentro e na periferia do campus da UFMT do Boa Esperança. Foi ali mesmo que o Toni se viciou. Nas imediações da república em que ele morava, assim como nos corredores da UFMT, a droga e traficantes transitam livremente. Que providência a instituição tem tomado acerca disso? Prefere tapar os olhos e ajudar a condenar seus jovens alunos.
Foi-se o tempo em que o romantismo e a rebeldia de fumar um baseado faziam parte do cotidiano universitário. Agora o ambiente universitário é um dos mercados de drogas pesadas, assim como seu entorno. E a tragédia do crack, a pior delas, bate à porta de todos nós. Meus amigos e colegas, muitos deles vivendo esse drama familiar, sabem do que estou dizendo. Acompanhei esses dramas quando morava ainda em Cuiabá.
Eu mesmo o vivo bem de perto. Tenho um irmão que vive a perambular pelas ruas de Goiânia se consumindo pelo crack. Gilmar, um dos sete filhos adotivos de minha mãe, era um rapaz trabalhador desde criança. Estudou, casou, formou família. Suas três filhas e esposa não agüentaram viver aquela tragédia e o abandonaram. Desde então passou a viver nas cracolândias do bairro Vila Nova, na capital de Goiás.
Minha mãe, já com seus 74 anos e morando agora em Goiânia, acompanha seu infortúnio e, dentro de suas limitações, nos mobiliza a todos para tentar salvá-lo.
O Toni tentou sobreviver. Poucos meses antes de voltar para Brasília, o recebi na minha casa, a qual ele freqüentava com os demais estudantes guineenses. Minha mulher era amiga dele, chegaram de Guiné-Bissau juntos. Ele para curso Economia e ela, Publicidade. Éramos capazes de deixar nossa casa aberta para ele, junto com meus filhos. O Toni não era um bandido. Repito: era uma pessoa amável e respeitadora.
Naquela tarde fria de julho e Cuiabá melancólica devido à carência de seu sol escaldante, o Toni chegou desesperado. Primeiro pediu dinheiro emprestado. Depois, muito envergonhado, chorou no nosso colo. Pediu ajuda, implorou para que afastássemos aquela sua vontade incontrolável de querer consumir a droga. Então começamos a mobilizar os amigos, colegas e seus professores. Ele necessitava de tratamento para poder concluir os estudos e voltar para o seu país.
Dois meses depois voltei para Brasília. Mas acompanhamos daqui a vida do Toni. Ficamos sabendo que ele havia ido para o tratamento. Depois fomos informados que havia vendido tudo que tinha e foi obrigado a entregar toda a sua bolsa de estudos para os traficantes. Quando perdeu a bolsa, foi para a rua mendigar. Foi num desses momentos que entrou na pizzaria naquela noite do dia 22 de setembro.
O Toni é filho de uma família de classe média alta em Guiné-Bissau. Seu pai é agrônomo e possui uma pequena fazenda. Idealista, sempre quis que os filhos tivessem boa formação para ajudarem no desenvolvimento do país. Tem irmãos que estudam ou estudaram na França, Inglaterra e Portugal. Parte da família fez carreira nas forças armadas, onde um tio seu é um dos comandantes.
Certa vez o Toni foi flagrado pela polícia em Cuiabá carregando um botijão de gás que ganhou de um dos colegas, pois o seu ele havia vendido para comprar crack. A polícia o abordou, o levou preso, apesar de afirmar que o objeto era dele. Passou o dia inteiro na delegacia, jogado numa sala e só saiu de lá depois que acionou a Polícia Federal, jurisdição da qual estão os estudantes africanos.
Aqui abro um parêntese. Não foram poucas as vezes que a UFMT acionou a Polícia Federal para perseguir os estudantes africanos que, por um motivo ou outro, não estavam freqüentando aulas ou haviam formado e ainda estavam no Brasil tentando pós-graduações ou empregos.
Setores da imprensa de Cuiabá, motivados por advogados e familiares dos assassinos, utilizam este caso do botijão, entre outros sem gravidade, para propagar que o Toni tinha passagens pela polícia. Como se a tal “passagem” fosse uma sentença de morte.
Antes de continuar, peço licença para contar duas histórias:
Em 1980, um rapaz que faria 20 anos dali a poucas semanas, cursava Agrimensura na antiga Escola Técnica Federal de Goiás e fazia estágio numa cidade a 20 quilômetros de Goiânia. Numa tarde, como fazia todos os dias, entrou às 17 horas no ônibus que o levaria de volta para casa, quando dois policiais o abordaram, algemaram, jogaram no camburão e levaram para a delegacia. Lavraram um boletim e mal ouviram a versão do rapaz. Em seguida, para fazê-lo confessar que havia feito um assalto, os policiais deram-lhe tapas nos ouvidos, murros, beliscões no nariz, nas orelhas, cascudos e ameaçaram quebrar seus dedos com um alicate e queimá-lo com cigarros.
As sevícias duram até que um dos policiais sugeriu ao delegado que o rapaz fosse levado para que a vítima identificasse o assaltante. Àquela altura a cidade inteira já sabia da prisão. Ao chegar à casa da senhora assaltada, de onde foram levados um televisor, aparelho de som e uma bicicleta do filho, o carro da polícia encontrou uma multidão que queria linchar o “bandido”. Os policiais com dificuldade abriram um corredor para a mulher chegar até o carro. Quando ela olhou pelo pára-brisa foi logo dizendo: “Não, não é este. O ladrão é branco!”.
Em 2004, um homem de 44 anos foi abordado pela polícia próximo à sua casa. Estranhou o fato de os policiais o obrigarem a ficar ao lado da viatura, longe do seu carro. Então um dos policiais faz uma rápida revista e aparece com um revolver e um pacote do que seriam drogas. Imediatamente o homem protesta, denuncia a “plantação” e só não vai preso porque estava com a identificação de secretário-adjunto de Comunicação Social do governo de Mato Grosso e ameaçou denunciar os policiais, que imediatamente fugiram do local.
O homem e o rapaz de 24 anos antes é a mesma pessoa: eu. Poderia aqui contar outras várias histórias de arbitrariedades e prisões às quais fui submetido.  Por ser negro, tido como ladrão, drogado e traficante, tive passagens pela polícia. Infelizmente aquela piadinha infame que de vez em quando ouvimos por aí  é de fato uma máxima entre policiais: “Preto parado é suspeito, correndo é ladrão”.
Quantas passagens pela polícia justificam uma morte?
Mereceria eu morrer por ter cometido o crime de ter nascido negro?
Mereceria eu morrer pelo crime de provocar aos policiais a sanha assassina de quem ainda nos vê como escravos, como sub-raça, como seres desprezíveis?
Mereceria eu morrer porque há cinco séculos retiraram meus antepassados da África, jogaram num navio negreiro, atravessaram o Atlântico, os leiloaram, os submeteram a ferro e fogo, os jogaram nos canaviais, minas e fazendas, os subjugaram nas senzalas, colocaram no pelourinho, humilharam, sugaram seus sangues e suores, para depois, com a abolição, os jogarem as ruas como se fossem animais, sem direito a dignidade?
Deveria eu morrer por ser filho de Clarice Laura e José Orozimbo, neto de José e Regina e de Josefa e Pedro Alves, por sua vez netos e filhos de escravos?
Este é meu crime?
Por favor, se é este o meu crime, então que me matem! Mas me matem apenas uma vez. Não façam como estão fazendo com o Toni.
Depois de ser trucidado pelos “bad boys da intolerância”,  Toni corre o risco de ser massacrado, pisoteado, sangrando até a última gota da sua dignidade.

PS: O corpo do Toni ainda está no IML de Cuiabá aguardando resultados de exames pedidos pelo delegado que acompanha o caso e a chegada da família para liberá-lo. Dona Cecília, mãe dele, me informou que um de suas irmãs, que é arquiteta na França, deve vir ao Brasil. A Embaixada de Guiné-Bissau em Brasília também está acompanhando o caso e prestando apoio à família. O governo brasileiro, por meio do Itamaraty, já se manifestou, repudiando o crime e pedindo desculpas à família e aos guineenses. Amigos e compatriotas do Toni estão se mobilizando em Cuiabá e aqui em Brasília, denunciando o assassinato e pedido para que seja tipificado como motivado por racismo.

1.10.11

Wall Street sob ocupação

Amigos e amigas o mundo virou do avesso!
Parte da Europa de pires na mão, pedindo ajuda a países que até bem pouco tempo eram chamados de “terceiro mundo”; os EUA – com um negro na presidência da república – numa crise sem precedentes em sua história e, agora, com Wall Street ocupada por ativistas que pregam valores políticos estranhos às tradições estadunidenses; o Brasil – liderado por uma mulher – dando lições de política e economia aos outros países poderosos do globo.
Chamou-me a atenção o protesto realizado em Wall Street. Buscando leituras que me fizessem compreendê-lo deparei-me com o texto que segue abaixo:

Ocupar Wall Street: o que todos querem saber sobre o movimento

É um coletivo de ativistas, sindicalistas, artistas, estudantes, que se reunira antes na campanha “New Yorkers Against Budget Cuts” [Novaiorquinos contra os cortes no orçamento]. Para muitos norte-americanos, essa ação direta não violenta é a única oportunidade que resta para que tenha alguma voz política. E isso tem de ser levado a sério pelos que ganham a vida na imprensa-empresa. Em artigo sob a forma de uma entrevista, ativista do movimento diz a que ele veio.

Nathan Schneider - The Nation

PERGUNTA: Ouvi dizer que o grupo Adbusters organizou o movimento Occupy Wall Street? Ou os Anonymous? Ou US Day of Rage? Afinal, quem juntou todo mundo lá?

RESPOSTA: Todos esses grupos participaram. Adbusters fez a convocação inicial em meados de julho, e produziu um cartaz muito sexy, com uma bailarina fazendo uma pirueta no lombo da estátua do Grande Touro [ing. Charging Bull], com a polícia antitumultos no fundo. O grupo US Day of Rage, criação da estrategista de Tecnologias da Informação, TI [ing. Information Technologies, IT] Alexa O'Brien, que existe quase exclusivamente na Internet, também se envolveu e fez quase todo o trabalho inicial de encontros e pelo Tweeter. O grupo Anonymous – com suas múltiplas, incontáveis e multiformes máscaras – agregou-se no final de agosto. Mas em campo, em New York, quase todo o planejamento foi feito pelo pessoal envolvido na Assembleia Geral de NYC.
É um coletivo de ativistas, artistas, estudantes, que se reunira antes na campanha “New Yorkers Against Budget Cuts” [Novaiorquinos contra os cortes no orçamento]. Essa coalizão de estudantes e sindicalistas acabou de levantar a ocupação de três semanas perto do City Hall, que recebeu o nome de Bloombergville, na qual protestaram contra os planos do prefeito, de demissões e cortes no orçamento da cidade. Aprenderam muito naquela experiência e estavam ansiosos para repetir a dose, dessa vez em movimento mais ambicioso, aspirando a ter mais impacto. Mas, de fato, não há ninguém, nem grupo nem pessoa, comandando toda a ocupação de Wall Street.

PERGUNTA: Ninguém manda? Ninguém é responsável? Como se tomam as decisões?

RESPOSTA: A própria Assembleia Geral tomou as decisões para a ocupação na Liberty Plaza, apenas alguns quarteirões ao norte de Wall Street. (Ali ficava o Parque Zuccotti, antes de 2006, quando o espaço foi reconstruído pelos proprietários da área, Brookfield Properties, que lhe deram o nome do presidente da empresa, John Zuccotti.) Agora, lá vai; vai soar como jargão. A Assembleia Geral é um coletivo horizontal, anônimo, sem chefia, sistema de consenso autogerido com raízes no pensamento anarquista, muito semelhante às assembleias que têm conduzido vários movimentos sociais em todo o mundo (na Argentina, na Praça Tahrir no Cairo, na Puerta Del Sol em Madrid e em outros pontos). Não é simples trabalhar para gerar consensos novos. É difícil, frustrante e lento. Mas os ocupantes estão usando o tempo e trabalhando sem parar. Quando chegam a algum consenso, o que muitas vezes exige dias e dias de discussões e de tentativas, a sensação de alegria é quase indescritível e inacreditável. Ouvem-se os gritos de alegria por toda a praça. É experiência difícil de descrever, ver-se ali, cercado de centenas de pessoas apaixonadas, empenhadas, rebeladas, criativas e todos em perfeito acordo sobre alguma coisa.

Para ler a matéria na íntegra é só clicar aqui.