22.6.08

Latuff acerta de novo...


Violência no Rio de Janeiro

Três jovens foram assassinados no Rio de Janeiro, na favela da Providência.
Estava esperando aquelas passeatas, com velas e panos brancos na janela. Aquelas que percorrem a orla na cidade maravilhosa, ou que terminam na Avenida Paulista ou no Ibirapuera aqui em São Paulo.
Cadê o pessoal bonito, bem arrumado e penteado – com as roupas de grife e os óculos escuros – protestando contra a barbárie e a violência?
Claro que não aparecerão, afinal os mortos eram garotos pretos e pobres, moradores da favela, uns até com passagem pela polícia...
A solidariedade e o senso de justiça estão ordenados por classe social e são altamente seletivos.
Fossem moços brancos, filhos de alguém com boa conta bancária ou com acesso privilegiado aos meios de informação e já teríamos passeatas e campanhas midiáticas tomando conta do país.
Abaixo segue uma reflexão do Itamar Silva, coordenador do Ibase:

Chacina da Providência
Itamar Silva*

A cidade do Rio de Janeiro, mais uma vez, é cenário das contradições que marcam o Estado brasileiro. Há avanço democrático na estrutura representativa formal, como conselhos, fóruns abertos à participação da sociedade, bem como leis cidadãs como a que garante e promove os direitos de crianças e adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA). Por outro lado, as polícias estaduais – militar e civil – e, agora, o próprio Exército brasileiro, responsáveis pela segurança de cidadãos e cidadãs, e que deveriam se pautar pelos parâmetros legais, promovem chacinas em favelas e áreas populares.
As favelas do Rio, tantas vezes usadas como moeda de troca na política clientelista, resistiram e conseguiram introduzir no manual das políticas públicas o tema da urbanização. O Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) é a mais recente evidência de que essas localidades estão inexoravelmente imbricadas à paisagem e à história dessa cidade.
No entanto, enquanto a população da favela se organiza para interferir no debate em torno das obras do PAC, ali, onde se constituiu a primeira favela dessa cidade, na Providência, uma atuação silenciosa (ao menos assim seria até as vésperas da próxima eleição), levada a cabo por um dos candidatos à prefeitura do Rio, promove uma maquiagem no local, com recursos do governo federal e sob a proteção do Exército. No entanto, o “cimento social” usado para rebocar as casas está manchado pelo sangue de três jovens negros, moradores daquela favela.
Na manhã do sábado, 14 de junho, David Wilson Florêncio da Silva, 24, Wellington Gonzaga Costa, 19, e Marcos Paulo da Silva, 17, foram presos por militares dentro da favela e levados ao quartel do Exército. Depois de interpelados, oficialmente foram dispensados – a partir daí “a notícia carece de exatidão”.
Os jovens não chegaram em casa. Por decisão daqueles militares, diretamente envolvidos na prisão – um tenente, um sargento e dois soldados –, foram levados até a favela da Mineira, a poucos metros dali e comandada por uma facção rival àquela que controla o Morro da Providência. No dia seguinte, os corpos dos três jovens apareceram junto aos detritos despejados no lixão de Jardim Gramacho, no município de Duque de Caxias.
Não se sabe qual foi a negociação entre os militares e os traficantes da Mineira. Não se sabe o que foi dito e a título de que aqueles militares cumpriram esse papel. Ainda não está claro qual a relação anterior entre os militares e os traficantes. No caso em questão, os jovens não trocaram tiros com e também não foram encontrados com eles “armamentos pesados” e nem mesmo foi feita “a maior apreensão de drogas”, argumentos que recorrentemente têm sido acionados pela polícia do Rio para “convencer” a sociedade carioca de que as execuções ocorridas nas favelas foram e são inevitáveis.
Mas apesar de todas as evidências da inocência dos jovens, a chacina da Providência foi incapaz de sensibilizar a classe média carioca e gerar manifestações de forte apelo emotivo, exigindo o cumprimento da lei.
Mais uma vez nos deparamos com dois pesos e duas medidas quando o fato é a morte violenta no Rio de Janeiro. Uns são “matáveis”: homens, jovens negros e moradores de favelas. Outros devem ser protegidos. Com certeza a dor dilacerante desses familiares terá menos solidariedade do conjunto da sociedade carioca e menos espaço nos horários e espaços nobres da mídia local do que costumam ter acontecimentos igualmente trágicos envolvendo jovens e pessoas de outras classes sociais.
Essa chacina recoloca o debate sobre o papel do Exército nas favelas cariocas. Independente de sermos a favor ou contra, este fato obriga, mesmo que por um tempo, que o Exército se recolha à caserna para refletir sobre o seu papel no controle da violência urbana e, especificamente, sobre a melhor forma de contribuir para o restabelecimento da autoridade perdida pelo Estado brasileiro nos territórios dominados pelo tráfico e/ou pela polícia mineira.
É com pesar que constatamos que num curto período de tempo, deixados a sós na sua atuação em uma favela, esses militares incorporaram o que há de mais vil na prática da chamada “banda podre” das polícias do Rio de Janeiro: pactuação com as forças marginais que dominam as favelas e o uso de vidas humanas como moeda de troca.
Então, o que o Exército continuará fazendo na Providência? Por que a aliança publicamente apregoada por Lula e Sérgio Cabral em torno dos investimentos no Rio de Janeiro não constrói um diálogo entre o Exército e a Secretaria de Segurança Pública do Estado? E por que um projeto de um senador, com uso de recursos públicos, conquista o direito de ter o Exército como cão de guarda? O que prevalecerá: o Estado de direito, democrático, igual para todos e todas ou o estado neopopulista em que se privatiza o público e não se respeita a vida?

*Coordenador do Ibase
Publicado em 20/6/2008.

21.6.08

Crônica de mortes anunciadas

Adriana Facina

Eu só imploro a igualdade pra viver, doutor
No meu Brasil
Que o negro construiu
Eu só imploro a igualdade pra viver, doutor
No meu Brasil

A injustiça vem do asfalto pra favela
Há discriminação à vera
Chegam em cartão postal
Em outdoor a burguesia nos revela
Que o pobre da favela tem instinto marginal
E o meu povo quando desce pro trabalho
Pede a Deus que o proteja
Dessa gente ilegal, doutor
Que nos maltrata e que finge não saber
Que a guerra na favela é um problema social

Eu não sou marginal

Eu só imploro a igualdade pra viver, doutor
No meu Brasil
Que o negro construiu
Eu só imploro a igualdade pra viver, doutor
No meu Brasil

A injustiça tem o colarinho branco
Usa sapato e tamanco compra tudo que quiser
Tem limusine, avião, BMW
Compra sua imunidade só pra agir de má fé
Enquanto isso os favelados vão sofrendo
E por aqui vou escrevendo
E vou cantando a minha dor, doutor
Indignado com tanta corrupção
Que maltrata os inocentes e alivia o ladrão

Com o tal do mensalão

Eu só imploro a igualdade pra viver, doutor
No meu Brasil
Que o negro construiu
Eu só imploro a igualdade pra viver, doutor
No meu Brasil

(Rap da Igualdade, MC Dolores)



A bela letra do MC Dolores, artista negro, criado na favela da Rocinha, a maior da América Latina, foi a primeira coisa que me veio à mente quando comecei a ouvir as notícias do absurdo assassinato de Marcos Paulo da Silva Correia, de 17 anos, Wellington Gonzaga da Costa, de 19 anos, e David Wilson Florêncio da Silva, de 24 anos. Moradores do Morro da Providência, onde surgiu a primeira favela carioca e cenário de muitas histórias constitutivas da identidade urbana do Rio de Janeiro, as suas mortes foram o resultado de um projeto macabro que associa um pastor-político, o Exército e novas-velhas modalidades de criminalização da pobreza muito em voga em nossa cidade.
Os rapazes tinham o perfil sociológico de quem, em nossa sociedade brutalmente desigual, está marcado para morrer. Jovens, favelados, voltavam de um baile funk, principal divertimento da juventude pobre hoje. Não sei se eram negros, mas provavelmente usavam as roupas que a mídia ajudou a estigmatizar como figurino de bandido: bonés, bermudas ou calças jeans, camisetas, tênis. Alegres e temporariamente empoderados pelo batidão, se sentindo um pouco mais livres, comentando sobre as gatas do baile, corpos que se expressaram na dança potente, aliviando a pressão. No seu caminho, uma invasão cuja arbitrariedade já havia sido denunciada por movimentos sociais e pela mídia alternativa. Disfarçados pela farda, braços do estado, bandidos interromperam a alegria do fim de festa. Abusos, palavrões, tapas, armas apontadas. Em resposta, alguma reclamação, talvez mesmo alguma menção a direitos do cidadão, como o de ir e vir, quem sabe, algum mais indignado “vai tomar no...”.
Como todo mundo sabe, bandido não perdoa. Surge a sinistra idéia do mercado de carne humana. Celulares e tecnologia à disposição da selvageria. Pagos com dinheiro público. Transporte de corpos vivos. Tortura de corpos semi-vivos. Corpos mortos desfigurados no lixão. Mães chorando sobre cadáveres confundidos com os restos da sociedade de consumo, como a lembrar aos moradores da Provi e a todos os favelados do Rio de Janeiro que eles são o lixo da nossa sociedade.
Indignação no cemitério. Protestos nas ruas. E mais repressão. Nas manchetes dos jornais da mídia cúmplice, que legitima os inseticidas sociais propagados pelas forças de insegurança pública, o protesto e a indignação viram ações de marginais: “tráfico fecha comércio”, “tráfico quer Exército fora do morro da Providência”. Covardemente, acabam por legitimar a criminalização e a repressão implacável do povo favelado. Consumado o assassinato de fato, a chacina simbólica continua em forma de “notícia”.
Presos os 11 militares responsáveis diretos pelo crime, as autoridades vêm a público prometer justiça. No entanto, sabemos que aqueles que realmente criaram essa situação estão protegidos. Quem vai responder pelo envio do Exército para atuar fora de suas funções nessa comunidade? Quem clamou por essa solução de sitiar toda uma população sob suspeita simplesmente pelo fato de ser pobre? Quais são as autoridades públicas, as empresas e os setores da sociedade civil que têm as mãos manchadas de sangue ao irresponsavelmente elaborar, executar, apoiar e legitimar uma política de extermínio de pobres em nosso estado?
A dificuldade em achar imagens dos jovens mortos na imprensa contrasta com a superexposição das fotos dos envolvidos no “caso Isabela”, mostrando claramente que a desigualdade na cobertura e na indignação midiática corresponde a uma espécie de bolsa de valores da vida humana, na qual as ações das vidas de gente como Marcos, Wellington e David valem muito pouco. E nessa lógica, é justamente o poder público que as mantém em baixa.
Em meio à dor, ao sofrimento, ao abandono, à revolta, confrontados com a solene indiferença dos que não se reconhecem como iguais a esses seres humanos, só resta o pedido à providência divina, que não é a do Crivella: proteção contra essa gente ilegal, doutor.


Fonte: Fazendo Média – 19/6/08.

20.6.08

Recomendação de leitura

A revista Caros Amigos deste mês está primorosa, como sempre. Corra até a banca mais próxima e compre o seu exemplar.
Caso queira visite o site, só para ter uma idéia. Para isso, basta clicar na capa abaixo:

Caminhada cultural

Recebi o convite que segue abaixo de uma amiga.
Para ver tudo o que esse grupo está fazendo entre no blog Expedición Donde Miras (é só clicar no título).


Participe da Caminhada Cultural pela América Latina

Em 05 de julho de 2008 um grupo de Artistas partirá da Zona Sul de São Paulo rumo a Cananéia, realizando o segundo trecho da Caminhada Cultural pela América Latina.
Caminharemos por nossas terras promovendo a cultura, a arte e o conhecimento entre os povos.
Em cada cidade visitada realizaremos oficinas culturais, debates e saraus com apresentações musicais, poéticas, intervenções locais, exibição de filmes, apresentações teatrais e de dança entre tantas outras manifestações e trocas que são possíveis nos Saraus.
Convidamos todos aqueles que queiram contribuir das mais diversas formas, tanto humanas, espirituais, como materiais, a fazerem parte desse sonho e inclusive a seguirem caminhada conosco.

19.6.08

Luta na Terra de Makunaima

Vejam o clipe promocional do documentário sobre a disputa na Terra Indígena Raposa/Serra do Sol, em Roraima:

http://uk.youtube.com/watch?v=J86r4noeQgM

Será apresentado no próximo dia 23, às 20h30m, na TV Cultura de São Paulo.

17.6.08

Sobre as mortes no Rio

Jânio de Freitas tem um texto ótimo e com tamanha lucidez que chega a espantar. Às vezes penso que ele é meio bruxo, clarividente, tal a maneira como expõe as mazelas do país, respeitando sempre as regras do bom jornalismo e de maneira ética e sóbria, bem ao contrário do que nos habituamos a ler na mídia grande.
A coluna dele hoje está soberba, mais uma vez.
Aborda com uma clareza impressionante as dúvidas que nos assaltam quanto a essa horripilante história ocorrida na cidade maravilhosa, lugar onde criminosos e autoridades andam lado a lado, quando não de braços dados.
A incrível história do assassinato dos três jovens, com participação dos homens (?) do Exército é bastante estranha realmente.
Fiquem com o texto:


O campo dos mortos

Jânio de Freitas
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Relatos do assassinato dos três rapazes estão minados de contradições e limitações investigatórias
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O CONFLITO em frente ao antigo Ministério da Guerra, hoje Comando Militar do Leste, no Rio, entre manifestantes do Morro da Providência e uma tropa do Exército, foi um ato de violência descontrolada muito adequado ao descontrole de violência que o originou, tanto no assassinato de três rapazes por pessoal do Exército como no tratamento dado ao caso.
Os relatos mais aceitos e difundidos do envolvimento de um tenente, três sargentos e sete soldados do Exército no assassinato dos três rapazes estão minados por contradições e, como de hábito, pelas limitações investigatórias e noticiosas quando vitimada gente humilde ou envolvidos militares – quanto mais quando há os dois.
Às narrativas insatisfatórias de que os rapazes foram mortos por bandidos inimigos do seu morro, depois de entregues para a morte pelo tenente e seus chefiados, contrapõe-se pelo menos outra versão, não posta em exame. É a possibilidade, que conta com indícios para ser mais do que isso, de que os rapazes não fossem entregues a bandidos, nem mortos por bandidos, mas por responsabilidade direta de algum ou alguns do grupo de militares.
O Morro da Providência não é uma favela típica. No centro do Rio, em sua decadência na República tornou-se bairro de classe média baixa, muito habitado por operários qualificados, e só em parte popularizado à maneira de favela. Já a favela da Mineira corresponde bem à designação, inclusive quanto à violência. Não é admissível, por isso, que um veículo do Exército chegasse à vontade até sua entrada e, ali, os três rapazes fossem levados por soldados à recepção pacífica que lhes dava um grupo de bandidos. E, para completar, de tudo isso em área com intenso trânsito de pedestres, só restassem duas "testemunhas". Anônimas.
"Testemunhas" cujos relatos, no "Globo", não divergem. Nas palavras de um dos tais anônimos: "Achei que fosse o início de uma ocupação do Exército na favela e que os jovens também fossem militares, porque estavam muito bem vestidos, até então pareciam calmos". Bem vestidos depois de presos em quartel do Exército já seria difícil. Mas um deles, ao menos um, foi visto nesse quartel pela mãe. Em narrativa quase imediata e não contestada, ela o viu "caído no chão, ensangüentado". Pouco depois já estaria "bem vestido" e, também como os dois companheiros, "parecia calmo" ao ser entregue a bandidos inimigos do seu morro? Ah, que elegância e que autodomínio admiráveis.
Não está claro como se deu o achado dos corpos, no dia seguinte, e como a polícia os localizou. Estavam em lugar muito distante, uma região à margem do Rio em direção às cidades serranas e a Minas. Estavam nas cercanias de um "lixão" em Gramacho, onde "possivelmente foram deixados por um caminhão de lixo". Logo, os garis os recolheram e puseram no caminhão de coleta sem os notar, três corpos adultos. E nem os notaram, ao serem despejados, os catadores de salvados do lixo que ali dividem a sua miséria com urubus.
Gramacho tem presença intermitente no noticiário por uma peculiaridade: é um lugar de mortes por armas, porém sem autoria e sem confrontos. São granadas em que crianças pisam, são obuses que outros encontram no capinzal e tentam recolher. E morrem. Gramacho, imenso e belo descampado, é um nome que se fez conhecido como campo de treinamentos do Exército. Por lá apareceram os três rapazes assassinados.
Fonte: Folha de S.Paulo - 17/06/08.

16.6.08

Entrevista com Aziz Ab'Saber na CartaCapital

Sem projeto e sem debate

Aos 83 anos, o geógrafo Aziz Ab’Saber, professor emérito da USP, continua a ser uma das cabeças mais lúcidas do País. E continua a se preocupar com as questões ambientais, agora com um único foco: alertar para a necessidade de se planejar mais, sobretudo em relação à Amazônia.

CartaCapital: Falta planejamento no caso da Amazônia?
Aziz Ab`Saber: Total. Qualquer coisa que diga respeito a um projeto é feita sem previsão de impacto, sem delimitação de subáreas. Na questão amazônica, cheguei a fazer um mapinha das 23 células espaciais e mandei para o Lula quando assumiu a presidência, com uma carta dizendo que deveria reunir em Brasília pessoas competentes, geógrafos, geólogos, sociólogos, indigenistas para estudar cada uma delas. Depois, se organizariam seis comissões com pós-graduandos e técnicos para ir até as células, comparando os problemas, que são muito variados. Mas alguém rasgou a carta, eles não querem a opinião de ninguém. Uma das minhas críticas ao governo Lula é a falta de democracia no debate das idéias.

CC: O Sr. diz que anda aflito com a questão da reserva indígena Raposa-Serra do Sol. Por quê?
AAS: Ali existem dois grupos: um que quer a descontinuidade de posse da reserva e outro que quer manter integralmente o território que foi demarcado. Mas o governador de Roraima quer simplesmente resolver o problema dos arrozeiros, que são só uma parte do problema. Em minha opinião, a primeira coisa a fazer seria um plano de Buffer Zone (zona tampão), porque os que estão além da linha demarcada oficialmente vão ter interesse em penetrar naquela área pelos mais variados motivos. Isto implica um planejamento correto, porque tem um grande trecho que fica na fronteira e a reserva é enorme. Na área onde estão os arrozeiros, eles devem continuar, e os recursos ganhos têm que ser destinados a favor dos grupos indígenas regionais, numa proporção mínima de 30% a 50% do valor da produção, sob o controle de um organismo independente. A presença do Estado, a favor dos índios e não do neocapitalismo, se faria a cada cinco quilômetros nessa faixa, com um centro cultural, um parque para crianças indígenas, hospital, escolas bilíngües, e assim por diante. Na parte mais norte, seriam instalados alguns alojamentos para cientistas.

CC: Como o Sr. vê a proposta da Academia Brasileira de Ciências de, em dez anos, transformar a Amazônia num pólo tecnológico e científico?
AAS: Esqueça essa gente do Rio de Janeiro que não conhece o espaço total da Amazônia. Para opinar sobre Roraima, estou falando com base nas viagens que fiz para lá, viagens sofridas em que fui aprendendo, fui vendo.

CC: O Sr. lamentou a saída de Marina Silva do ministério do Meio Ambiente?
AAS: Não, não lamentei. Mas achei que foi dramático do ponto de vista político. Sai a Marina e entra no Plano Amazônia Sustentável o Mangabeira Unger. Quando voltou ao Brasil, o Mangabeira queria ser recebido como um deus, porque veio de Harvard. E no Instituto de Estudos Avançados da USP ficou numa salinha onde ninguém o recebia. Quando saiu, xingava o instituto publicamente. Mais engraçado é o Lula tê-lo nomeado Secretário de Planejamento a Longo Prazo, quando o que nós precisamos desesperadamente é resolver os problemas regionais no presente momento, pensando no futuro.

CC: Hoje o maior problema da Amazônia é o agronegócio?
AAS: Não. O que é preciso é evitar que o agronegócio faça o que queira, com a floresta a seu favor, sempre. Um fazendeiro do Sul do Pará defendeu bem a posição dele, dizendo o seguinte: “A propriedade é minha e faço com ela o que quiser e quando quiser.” Isso na cara do estado brasileiro. Em Marabá, vi uma passeata de fazendeiros com mais de mil e quinhentas pessoas, com toda a cidade quieta, amedrontada. Depois vim a saber que era a maneira de dizer que eles mandam na Terra do Meio (PA). Não há presença do Estado ali.

CC: O governador Blairo Maggi é mesmo o vilão do meio ambiente no Brasil hoje?
AAS: Mas é claro. E ficou amigo do Lula por razões que a gente não sabe. As coisas que ele diz: “Tem que haver desmate para plantar”. Só que o burro não sabe que no século 16 também era assim e não foi feito um grande desmate. Lembro que a primeira vez que fui a Pernambuco, em 1972, desmatava-se apenas da meia encosta para baixo e ao longo de colinas. O lugar onde estava a cabeceira dos rios estava bem preservado. Maggi, não, o negócio dele é desmatar. Agora, na Amazônia, cada caso é um caso que tem que ser pensado e resolvido, sem fragmentação e sem criar mosaicos a favor do neocapitalismo.


Fonte: CartaCapital – 16/6/08.

14.6.08

Che Guevara: 80 anos!

Fonte:http://www.che80.co.cu/galeria.html#07



Se estivesse vivo Che completaria 80 anos hoje.
Desde a minha juventude tenho nele um exemplo de revolucionário, de uma pessoa que amou o seu povo – que era o povo do mundo – que lutou de modo coerente por aquilo que acreditava e não perdeu a ternura.
Era um homem e, portanto, cometeu erros, equivocou-se, apaixonou-se e odiou. Mas como estadista e revolucionário foi um ser humano extraordinário.
Não cedeu ao deslumbramento do poder, sempre fez do seu discurso também a sua prática.
Foi e é amado por seu povo, em todos os cantos do mundo, apesar de combatido por todos aqueles que não ousam sonhar com um mundo melhor, que preferem o individualismo à solidariedade e generosidade.
Che personificou para as gerações que o sucederam a possibilidade de um futuro mais decente para a humanidade.
Talvez nesse momento de crise de alimentos e de justiça seja o caso de repensar seus sonhos.
Vale a pena ver a página que Cuba preparou para comemorar os 80 anos de Ernesto Guevara de la Serna, é só clicar aqui.
Aqui um dos mais belos discursos de Che, pronunciado na ONU em 1964.
Também merece ser ouvida a canção “Hasta Siempre” do músico, compositor e cantor cubano, Carlos Manuel Puebla (1917-1989), conhecido como "o cantor da Revolução". "Hasta Siempre", dedicada a Ernesto Guevara de la Serna, é sua criação mais popular, clique aqui para ouvir.

Estou de volta!

Ontem terminamos mais um estudo do meio no Vale do Paraíba, o terceiro realizado com os alunos do Pueri, unidade Verbo Divino.

Para quem não é do ramo, explico. Estudo do Meio compreende uma série de atividades, dentre elas algumas que chamamos de pré-campo, realizadas em sala de aula, num período anterior à viagem. Neste caso, aulas de Química, Geografia, Física, História e Português, relacionadas aos temas que foram investigados no trabalho de campo. O trabalho de campo, que às vezes confunde-se com viagem ou passeio, é fundamentalmente de pesquisa e contato direto com a realidade, isso acontece por meio de visitas técnicas e entrevistas com população do local estudado.

O Estudo do Meio não termina com a viagem, ele prossegue com a sistematização dos dados colhidos e comparação com registros documentais em livros, periódicos, sites etc.

No nosso caso começamos os registros no período anterior à viagem, com orientações e recomendações de leituras e da própria viagem, feitos no blog Pueri no Vale (clique no título para acessá-lo).

O trabalho é exaustivo, mas de resultados excelentes, não só no tocante à produção de conhecimento, mas também com relação à postura dos alunos e também no relacionamento entre eles e com as realidades visitadas.
Abaixo um pouco das imagens colhidas.

8.6.08

Vale do Paraíba, lá vou novamente

Pela 3ª vez acompanharei meus alunos no Estudo do Meio no Vale do Paraíba.
Volto ao blog somente no sábado.
Querendo mais notícias é só visitar: www.puerinovale.blogspot.com.

Editorial da Folha de S.Paulo sobre a Amazônia

O editorial da Folha de S. Paulo de hoje (08/06) é bem equilibrado ao tratar de um problema que têm movimentado brasileiros e estrangeiros: a questão amazônica.
A discussão frequentemente extrapola o bom senso e, quase sempre, ignora o bem estar e o desenvolvimento local.
Aproveitar os institutos de pesquisa do norte do país, somar a eles uma gama de recursos compatíveis com a grandeza e as potencialidades da floresta, poderia ser um caminho adequado para eliminar as especulações internacionais.
O que não pode é deixar para os grileiros e o “agrobanditismo”, que conjugados destroem tanto a natureza quanto a cultura e as populações locais.
Embora conservadora no trato das questões econômicas a Folha tem demonstrado acerto no trato das questões amazônicas e indígenas.
A leitura é merecedora de reflexão.

A hora da Amazônia
Tecnologia e conservação deveriam nortear um novo modelo para desenvolver a região que ocupa metade do Brasil

O DESMATAMENTO da Amazônia, além de estar no fulcro da imagem brasileira no exterior, desperta repúdio generalizado na opinião pública nacional. Após cinco séculos de crescimento com dilapidação de capital natural, o país enfim se dá conta de que seu futuro depende de uma guinada na marcha sobre a floresta, "a ferro e fogo".
O desafio está não tanto em conciliar desenvolvimento com preservação ambiental, dicotomia ultrapassada, mas em casar sustentabilidade com tecnologia. Assim será possível reverter em benefício da população amazônica e do país, hoje e para futuras gerações, a exploração de um dos maiores acervos de recursos naturais estratégicos.
A virtual unanimidade em favor de preservar os mais de 80% de floresta amazônica remanescente, contudo, não implica clareza sobre os meios de realizar o objetivo. Cabe ao governo federal arbitrar os interesses em jogo. Com o momento adquirido pela questão amazônica, é hora de formular uma política ousada para a região que cobre mais da metade do Brasil.
Começa a esboçar-se algo próximo de um consenso quanto às linhas gerais de um programa que não se reduza a uma lista de obras. O primeiro obstáculo a superar é a reticência do presidente Lula em assumir um compromisso concreto com a progressiva redução do desmatamento.
Só uma tal meta de Estado, vinculada a prazo definido, porá termo à ambigüidade da política ambiental. Seria factível estabilizar a taxa de desmatamento, até 2015, no patamar máximo de 10 mil km2 anuais, próximo do que se obteve em 2007. Além disso, investir cerca de R$ 1,5 bilhão anual para recuperar 150 mil km2 em dez anos.
A soma é alta, mas compatível com a capacidade de financiamento do Estado brasileiro. Basta mencionar que a cada ano valores similares são lançados em multas ambientais nunca arrecadadas. Caberia priorizar sua cobrança, focalizando as de maior valor e potencial para produzir efeitos demonstrativos.
O nó górdio da destruição reside na questão fundiária. Apenas 4% das terras na região são áreas privadas com títulos validados; outros 43% correspondem a unidades de conservação e terras indígenas. Do restante, 1 milhão de km2 (21% do total) são áreas supostamente públicas, as quais urge mapear e inscrever no patrimônio da União.
Há ainda 1,6 milhão de km2 (32%) de terras alegadamente privadas. Estima-se que um terço -420 mil km2, o equivalente a meio Mato Grosso- seja de posses ilegais. O governo federal deveria regularizá-las, mas só até o limite de 500 hectares e contra pagamento, para não premiar a grilagem.
O zoneamento ecológico-econômico constitui ferramenta importante para disciplinar o uso da terra, mas é ilusório aguardar que abranja os 5 milhões de km2 da Amazônia Legal. Cumpre priorizar regiões onde avança a fronteira agrícola. Como princípio geral, impõe-se circunscrever a agricultura intensiva e a pecuária às áreas já desmatadas.
Do governo federal se exige ainda que aprofunde o uso do crédito como alavanca para forçar o cumprimento de mínimos padrões fundiários, ambientais e trabalhistas. Não faltam fontes como fundos constitucionais para fomentar atividades de extrativismo de baixo impacto. É urgente financiar mais estudos para conceder a exploração de florestas públicas à iniciativa privada.
A revolução amazônica dependerá também de forte influxo de conhecimento. O governo deveria encampar a proposta da Academia Brasileira de Ciências de investir R$ 30 bilhões até 2018 em pesquisa aplicada na região. O objetivo seria criar cadeias produtivas de alta tecnologia e elevado valor agregado, capazes de atrair capital privado.
O modelo de desenvolvimento para o trópico florestal ainda está por ser inventado. Mais que um fardo, isso representa para o país uma grande oportunidade.


Fonte: Folha de S.Paulo – 08/06/08.

7.6.08

Até a Venezuela...

O futebol pentacampeão, de resultados, está mesmo triste.
Em que pese a significativa melhora da seleção venezuelana, quando comparada ao time de uma década atrás, o desempenho da seleção brasileira foi medíocre.
A propósito do jogo de ontem, a BBC Brasil noticia:

O presidente venezuelano Hugo Chávez não ficou de fora da festa e aproveitou a oportunidade para provocar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e recordá-lo de uma antiga advertência.
"Eu já tinha dito ao Lula, que um dia ganharíamos do Brasil, ganhamos do Brasil, chegou o dia, é um dia histórico", disse Chávez ao pedir um "viva a vinotinto", como é conhecida a seleção venezuelana, durante um ato público com membros do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV).
Chávez costumava brincar com Lula durante seus encontros bilaterais que um dia a seleção venezuelana ganharia a brasileira. O presidente brasileiro sempre sorria, incrédulo.

Para ler a matéria completa é só clicar aqui.

6.6.08

Carta aberta ao Presidente do Brasil

Quarta-feira, 04 de Junho de 2008 11h16min
Porto-Principe, HAITI Quarta-feira 28 de maio de 2008.

Senhor Presidente,

O senhor deve ter se dado conta que sua visita de hoje, 28 de maio do 2008, não recebeu as boas-vindas como aquela de 2006 quando, acompanhado da "seleção", enlouquecia meio-mundo, tratando de nos fazer pensar que a lua é um queijo. Na realidade, caíram as mascaras. Primeiro pelo rotundo fracasso da Minustah no que toca aos objetivos de maio de 2004, do mesmo Conselho de Segurança da ONU. Depois, porque ninguém mais acredita na "desinteressada ajuda" dessa missão. Nós, de imediato entendemos o que faz parte desta "benevolência”. A vinda do filho do vice-presidente José Alencar, proprietário da mais importante indústria têxtil do Brasil, para localizar as zonas francas e verificar com seus próprios olhos nossa famosa "mão de obra barata", acabou por abrir-nos os olhos. Hoje, quando novamente capitalistas nos visitam, seguramente ávidos em apostar neste "ouro vivo", os objetivos vão ficando mais precisos.

Mas há mais. O povo inteiro viu o comportamento tanto dos altos responsáveis pela missão, cobrando um dinheirão - neste país tão desprovido de tudo -, como dos militares: a repressão nos bairros populares demonstra, tal qual a arrogância dos chefes no comando ou a atitude dos soldados nos tanques, com a metralhadora sempre apontada para nós, que, se aproveitando da situação de dominação instalada, acometem violações e outras ações que não tem nome. Ou o terror semeado durante os últimos acontecimentos. O fundo e a forma já não deixam mais nenhuma dúvida: trata-se obviamente de uma tutela armada, de uma ocupação, que a suposta "ajuda sul-sul" (que não é mais que uma solidariedade entre classes dominantes de país a país sob a direção das multinacionais de rapina) já não consegue mais enganar. Como tudo isto chegou tão longe? Como a mais extraordinária revolução do continente pôde dar à luz a tão profunda humilhação? Como governos resultantes das lutas dos trabalhadores e das mobilizações populares puderam chegar a jogar conscientemente o papel tão degradante de executor dos planos imperialistas?
Tratamos de explicar no texto "Toda a roupagem da mentira", que expõe a lógica de tal sentença, e os reais objetivos do projeto imperialista-burguês de exploração ilimitada e o papel que toca a você, recusa a sua "ajuda" tal como a concebe, repudia totalmente a presença das suas tropas armadas e termina preconizando que outra cooperação é possível". Uma cooperação que unificaria todos os operários, todos os trabalhadores e todos os povos, naturalmente, fundamentalmente irmãos; na agricultura, na medicina, na construção das suas cidades, no riso franco, nas danças e cantos libertários, na produção e no intercâmbio coletivo.”.

Assim, senhor presidente, considerando que a presença das forças de ocupação da ONU no Haiti constitui uma gigantesca bofetada no povo haitiano e em nossos ancestrais que lutaram para nos deixar um território livre de toda dominação estrangeira: em nome desta luta contra a dominação, em nome do direito a autodeterminação o do povo haitiano, em nome do direito a vida de toda a gente morta nos bairros populares pelas balas criminosas dos seus soldados, mas também com o mesmo sentimento que o ajudou a declarar como não grata a quarta frota norte-americana nos portos do seu país; e, considerando a necessidade de estabelecer uma cooperação horizontal entre os povos do sul onde não existiria exploração, requeremos, Senhor Presidente, que proceda a imediata retirada de suas tropas armadas do nosso país.

Yannick ETIENNE - Batay Ouvriye
Camille CHALMERS - Plateforme Haitienne pour um Droit Alternatif
Marc-Arthur FILS-AIME - Institut Culturel Karl Leveque
Guy NUMA - Mouvman Demokratik Popile


PS. Queríamos entregar esta carta em suas próprias mãos, mas a Polícia Nacional, que está sob o comando dos seus militares, nos proibiu categoricamente toda e qualquer aproximação bem como qualquer livre manifestação de opinião.

Fonte: Palavra Latina (mas fiquei sabendo dela no Vi o Mundo)

4.6.08

Cronologia de uma montagem

Outro dia manifestei meu espanto com relação aos computadores das FARC apreendidos após o assassinato de Raúl Reyes. Depois de um bombardeio noturno, com elevado poder de fogo e destruição, várias pessoas são assassinadas, o acampamento é destruído, mas os resistentes laptops resistem impávidos, produzindo provas contra as FARC, Chávez, Correa e quem mais for conveniente para Uribe, Bush e Cia.
Leiam o texto abaixo e reflitam:

CRONOLOGIA DE UMA MONTAGEM

Como transformar Chávez em um terrorista em dois meses

O bombardeio de um acampamento das FARC no Equador, por parte da Colômbia, iniciou uma autêntica guerra midiática. Qualquer semelhança entre a versão da grande mídia e a realidade é mero acaso. Saiba como operou o eixo midiático formado pelos jornais The Wall Street Journal (EUA), El Tiempo (Colômbia) e El País (Espanha).

Pascual Serrano - Diagonal

Primeiro disseram que era ditador, mas não convenceram ninguém, por ser ele o presidente americano que mais eleições ganhou. Depois propagaram que ele estava se armando até os dentes e era um perigo para a estabilidade da região, mas a verdade é que Chávez nunca utilizou uma única arma fora de seu país. Ou seja, que o último lance é transformá-lo em terrorista, por meio de uma operação midiática de dois meses. Vamos repassar a cronologia da operação e comparemos cada acontecimento: a versão do eixo midiático (El País, El Tiempo, The Wall Street Jornal, o presidente colombiano Uribe, a Casa Branca) e a versão do que realmente aconteceu.

1º DE MARÇO DE 2008
VERSÃO DO EIXO MIDIÁTICO: O Exército colombiano ataca um acampamento das FARC em uma perseguição perto da fronteira do Equador. A notícia ocupa a primeira página da imprensa internacional.
VERSÃO REAL: O Exército colombiano bombardeou um acampamento com os representantes internacionais das FARC às três da manhã, enquanto todos dormiam. Para isso, invadiram território equatoriano adentrando dois quilômetros no país. Assassinaram, também, três estudantes mexicanos de uma delegação que estava se entrevistando com o comandante Raúl Reyes. Utilizaram tecnologia e mísseis norte-americanos e, depois, assassinaram os feridos com um tiro de misericórdia. Essa delegação guerrilheira estava no Equador para negociar com as autoridades francesas a libertação de Ingrid Betancourt. A morte de Reyes abortou essa operação. Todos estes elementos vão se tornando conhecidos posteriormente, pouco a pouco, e são incorporados somente nas páginas interiores dos jornais. Outro detalhe a ser considerado é que o jornal El Tiempo é propriedade da família Santos, e seu diretor – Enrique Santos – é irmão do ministro de Defesa – Juan Manuel Santos – e primo do vice-presidente colombiano, Francisco Santos.

9 E 10 DE MAIO DE 2008
VERSÃO DO EIXO MIDIÁTICO: No dia 9 de maio, The Wall Street Journal afirma que teve acesso a documentos procedentes do computador de Raúl Reyes, os quais confirmariam que Chávez enviou dinheiro para as FARC. A notícia é reproduzida pelo jornal El Tiempo e por todas as agências internacionais. No dia seguinte, 10 de maio, o jornal El País, da Espanha, afirma que também teve acesso aos documentos de Raúl Reyes e tem como manchete “Os papéis das FARC acusam Chávez”. Mais uma vez, o jornal El Tiempo reproduz a notícia.

15 DE MAIO DE 2008
A Interpol torna público o relatório sobre os supostos computadores de Raúl Reyes.

16 DE MAIO DE 2008
VERSÃO DO EIXO MIDIÁTICO: A imprensa norte-americana, espanhola e colombiana tem como manchete que o relatório da Interpol revela que os computadores eram das FARC e que não foram manipulados pelas autoridades colombianas. O jornal El País afirma que “segundo a agência policial, a Venezuela financiou as FARC”.
VERSÃO REAL: O relatório da Interpol não faz nenhuma referência ao conteúdo dos arquivos, uma vez que, tal e como esclarecem no início, os especialistas informáticos que fizeram a vistoria “eram provenientes de fora da região e não falavam espanhol” – eram asiáticos –, com a finalidade de “eliminar a possibilidade de que fossem influenciados pelo conteúdo dos dados que estavam analisando”. O relatório confirma que milhares de arquivos apresentam data falsa: “2.110 arquivos cujas datas de criação oscilam entre 20 de abril de 2009 e 27 de agosto de 2009; 1.434 arquivos cujas datas de última modificação variam entre 5 de abril de 2009 e 16 de outubro de 2010” e que nos três computadores os discos rígidos externos e as chaves USB foram conectados depois do ataque e antes de serem entregues aos investigadores de informática forense da polícia judiciária colombiana. A Interpol denuncia, portanto, que “o acesso aos dados contidos nas citadas provas não se ajustou aos princípios reconhecidos internacionalmente para o tratamento de provas eletrônicas por parte dos organismos encarregados da aplicação da lei”, ao ponto de que em dias posteriores ao 1º de março de 2008, ou seja, estando em mãos das autoridades colombianas, fica comprovada a “criação de 273 arquivos de sistema, a abertura de 373 arquivos de sistema e de usuário, modificação de 786 arquivos de sistema e eliminação de 488 arquivos de sistema”.
Quanto à procedência desses computadores, o relatório começa esclarecendo que “a verificação realizada pela Interpol das oito provas instrumentais citadas não implica na validação da exatidão dos arquivos de usuário que elas contêm, da interpretação que qualquer país possa fazer desses arquivos, nem da sua origem”.
Nesse mesmo dia é celebrada a Cúpula América Latina e Caribe-União Européia, em Lima. O assunto dos computadores das FARC e as acusações contra Chávez dominam a agenda informativa.

CONCLUSÕES
O desenvolvimento das informações difundidas mostra uma clara coordenação entre meios norte-americanos, como The Wall Street Journal, e os jornais El País e El Tiempo. É possível observar que El Tiempo começou difundindo os “vazamentos” do Governo sobre as circunstâncias do ataque, todos desmentidos posteriormente. Por isso, passaram para a estratégia de que fossem os meios amigos internacionais os que recebessem os vazamentos e difundissem os supostos conteúdos dos computadores. E foi assim que operou o eixo midiático integrado pelo tridente El Tiempo-El País-The Wall Street Journal. Ou seja, o jornal colombiano vinculado com o Governo; o espanhol, cuja empresa aspira obter a concessão de uma licença de televisão aberta na Colômbia e o jornal norte-americano que se encarregou da informação econômica mundial e que representa a ideologia conservadora estadunidense. Um maquinário bem engraxado para convencer o mundo de que Chávez é um terrorista. Afinal de contas, no Iraque deu certo acusar Sadam de manter relações com Al-Qaeda.

ASSOCIAÇÃO DE VÍTIMAS DO COMPUTADOR DE REYES: QUE NÃO FALTE O HUMOR
Que tenham aparecido computadores, discos rígidos e memórias portáteis em perfeito estado depois de um bombardeio é algo que provocou uma seqüência de comentários humorísticos na Venezuela. O escritor Roberto Hernández Montoya assinalou que “sua carcaça, de uma liga de concubinato de chumbo com pizzicato de titânio reforçado, torna-o invulnerável a mísseis de todo tipo, a bombas de fragmentação, a bombas inteligentes e a qualquer arsenal proibido por acordos internacionais. Você morre arrebentado e o computador continua como uma uva e produzindo materiais ao desejo do novo usuário”. Não falta quem tenha dito que não seria estranho que, mais adiante, algum porta-voz da Casa Branca mencione os vínculos ‘sinistros’ de Obama com as FARC —porque isso mostrariam os documentos dos computadores— após as declarações do democrata de que estaria disposto a “manter conversações diretas com os dirigentes de países como Irã, Síria, Cuba ou Venezuela”.
Ainda no plano do humor, foi criada a Associação de Vítimas do Computador de Raúl Reyes, cuja primeira atividade será a convocatória para um concurso de contos: solicitou à população que envie relatos inverossímeis, tal como os que aparecem no computador de Reyes. O mais incrível e inexato dos contos será o que levará o prêmio, que vai consistir, é claro, em um computador. Inclusive há uma paródia na televisão estatal que apresenta um computador, resgatado dos restos do Titanic no fundo do Atlântico e completamente seco, que guarda informações sobre as relações de Uribe com pessoas à margem da lei.
Pascual Serrano é jornalista. Acaba de publicar "Meios violentos. Palavras e imagens para o ódio e a guerra". Maio 2008. El Viejo Topo.


Tradução: Naila Freitas / Verso Tradutores
Fonte: Agência Carta Maior – 03/06/08.

2.6.08

Evo Morales reafirma ilegalidade de referendos autonomistas

Embora ignorada pela mídia a Bolívia continua conturbada por um grupo de golpistas sedentos de sangue nativo.
Enquanto exploraram todo o povo, refestelaram-se, agora querem "cada um por si". Nossa mídia cala-se, como bem queria "el rey". Só conseguem confrontar-se com os pobres e despossuídos, aos poderosos oferecem o lombo.
Leiam o excelente texto da Agência Carta Maior:
Evo Morales reafirma ilegalidade de referendos autonomistas

Governo boliviano considerou ilegal referendos realizados nos departamentos de Beni e Pando, neste domingo. Proposta de autonomia teve apoio de 86% e 85% dos votantes, respectivamente, mas índice de abstenção foi elevado. OEA considera que crise no país é muito preocupante.

Redação - Carta Maior

Os departamentos (estados) de Beni e Pando, na Bolívia, realizaram neste domingo (1º) referendo sobre o estatuto de autonomia em relação ao governo boliviano. O apoio foi de 86% e 85% dos votantes, respectivamente. O índice de abstenção, porém, foi alto, assim como ocorreu no referendo realizado no departamento de Santa Cruz. Somando a abstenção e os votos pelo “Não”, 56,23% dos eleitores de Pando rechaçaram o estatuto autonômico proposto pelo governo do departamento. No departamento de Beni, esse índice chegou a 47,19%.
A consulta foi declarada ilegal pelo presidente Evo Morales. Durante o referendo, ocorreram conflitos em ambos os departamentos, que provocaram uma morte. Além disso, dezenas de urnas foram queimadas e houve denúncias de fraude durante as votações.
A Constituição boliviana – aprovada em dezembro – vem sendo questionada por algumas províncias que não vêem seus interesses representados no texto e propuseram a realização dos referendos de autonomia. As classes mais ricas da Bolívia também se opõem à proposta de Reforma Agrária apresentada pelo governo Evo Morales.
Beni e Pando ocupam um quarto do território da Bolívia, mas tem apenas 5% da população do país, apresentando elevados índices de pobreza (entre 70 e 75%). Sua atividade econômica é baseada na exploração dos recursos florestais (a maior parte dos dois territórios está localizada na região amazônica) e na criação de gado.
Já o outro departamento que realizou referendo pela autonomia, Santa Cruz, é a região mais rica da Bolívia e seus governantes defendem a autonomia, entre outras razões, por não querer sua riqueza distribuída pelas regiões pobres do oeste do país, onde a maioria da população é de origem indígena. No dia 22 de junho, será a vez do departamento de Tarija, que tem importantes reservas de gás do país, realizar um referendo autonomista.
Ainda na tarde de domingo, o governo da Bolívia destacou que houve uma ''ausência arrasadora'' nos referendos de Beni e Pando. O ministro da Presidência, Juan Ramón Quintana, afirmou que o governo constatou ''muito pouca participação da população'' nos referendos de Beni e Pando, convocados pela oposição separatista e pela elite boliviana.
Quintana qualificou a falta de participação de “rejeição explícita” aos estatutos autônomos referendados, classificados por ele como uma “impostura democrática”. Já o porta-voz do Palácio de Governo, Ivan Canelas, reafirmou que o Executivo não reconheceria as consultas populares. “É uma perda de tempo, de recursos econômicos, de desgaste da população (...) esses estatutos foram redigidos sem a participação da população”. Canelas disse ainda que o melhor caminho para a oposição nestes departamentos é dialogar, ao invés de seguir o que chamou de “caminho da ilegalidade”.
O prêmio Nobel da Paz, Adolfo Pérez Esquivel, afirmou que os referendos sobre o estatuto autônomo na Bolívia são uma ''tentativa de golpe de Estado disfarçado''. Pérez Esquivel, que esteve na Bolívia no início de maio, disse em entrevista coletiva que o primeiro plebiscito, o de Santa Cruz, foi organizado por ''fazendeiros'' cuja intenção é ''desestabilizar o Governo e gerar uma situação de confronto''. Além disso, chamou a atenção para ''o alto índice de racismo'' das classes dirigentes em Santa Cruz e também alertou que os veículos de comunicação bolivianos ''assumiram uma opção clara pelo estatuto e por privilegiar o capital financeiro sobre a vida do povo''.
A Organização dos Estados Americanos (OEA), que mantém atualmente uma missão mediadora para tentar resolver a crise na Bolívia, classificou a situação no país como muito preocupante. Em sua última resolução sobre a situação boliviana, aprovada no dia 3 de maio, a OEA expressou sua "solidariedade e apoio ao povo da Bolívia, ao governo constitucional, à institucionalidade democrática e às autoridades eleitas pelo povo boliviano". O Conselho Permanente da organização condenou na ocasião "qualquer tentativa de ruptura" da ordem constitucional e da integridade territorial do país.

Fonte: Agência Carta Maior – 02/06/08

1.6.08

Células-tronco, inflação e desmatamento dominam as páginas das semanais

Cada uma a sua maneira as semanais abordam os problemas mais preocupantes do momento.
CartaCapital apresenta Blairo Maggi, governador do Mato Grosso, na capa e uma matéria densa sobre ele e os seus desafetos ambientalistas. Ouve os dois lados, sem deixar de se posicionar, como acontece normalmente com essa publicação.

Já a revista Istoé coloca na capa o resultado do julgamento pelo STF das células-tronco embrionárias. Apresenta uma matéria sobre o mesmo governador, mais superficial e um pouco mais simpática a ele.

A revista Veja coloca na capa o monstro da inflação. Como tem demonstrado ultimamente a sua capa está mais civilizada e elegante.

Época traz uma matéria de comportamento, que mexe num grande vespeiro: homossexualidade e exército. Compensa ver a entrevista com os dois sargentos no Youtube (clique aqui).
Uma chamada de capa anuncia as “cartas secretas das FARCs para Lula”. Como a matéria não está na internet temo que seja fruto da apreensão do laptop de Raúl Reyes, após a invasão colombiana ao território equatoriano para atacar um acampamento da FARC. Interessante observar que as bombas destruíram tudo que estava ao redor, menos o notebook de forma bem conveniente para o governo Uribe e seu mentor Bush.