Ao
sugerir que a solução para a corrupção endêmica seja a saída de Dilma,
manifestantes evidenciam seu raso entendimento do regime democrático no país,
opina editor-executivo da DW Brasil
por
Deutsche Welle — publicado 16/03/2015 10:27
*Por
Rodrigo Rimon Abdelmalack, editor-executivo da DW Brasil
Centenas
de milhares de pessoas foram às ruas participar das manifestações convocadas
para este domingo 15 por organizações diversas em dezenas de cidades do Brasil
e do exterior. O objetivo da maioria: cobrar o impedimento da presidente,
acusando-a de envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras.
E
não pode ter sido coincidência a escolha desta data para exercer este precioso
direito garantido pela Constituição, já que neste dia nossa jovem democracia
completou seus 30 anos, após a posse de José Sarney na Presidência, em 1985.
Juntos,
os três maiores grupos organizadores dos protestos têm apenas pouco mais de um
milhão de seguidores no Facebook. Mas, nos dias que precederam os protestos,
estes foram ganhando atenção, justamente por se tratar de um produto das redes
sociais, oriundo de diversos setores da sociedade, diferentes entre si e, a
princípio, independentes também de partidos políticos.
Em
tempo, políticos de oposição correram a se pronunciar contra um impeachment.
Por provocar um "aprofundamento do caos", como disse Marina Silva. Ou
por ser comparável a uma bomba atômica, como polemizou FHC: "É para
dissuadir, não para usar".
Fato
é que a principal exigência formulada pelos manifestantes deixa um gosto amargo
justamente nessa data simbólica. Ao concentrar as críticas apenas em Dilma
Rousseff, mostram que pouco ou nada entendem do sistema político. E, ao sugerir
que a solução para a corrupção endêmica seja um impeachment, evidenciam seu
raso entendimento do regime democrático no país.
Não
que não haja motivos para protestar. Os brasileiros têm toda razão ao achar que
o enorme potencial do país está sendo desperdiçado. O Brasil é um dos maiores
exportadores de alimentos, mas não consegue eliminar a fome. Conta com um
território de dimensões invejáveis, mas é incapaz de realizar uma reforma
agrária. Possui grandes reservas de petróleo, mas a reputação da Petrobras está
arruinada. Tem algumas das maiores bacias hidrográficas do mundo, mas falta
água nos centros urbanos. Minorias, entre elas indígenas e homossexuais, lutam
por garantias elementares. Obras urgentes para garantir a infraestrutura
nacional são interrompidas ou nem saem do papel.
Sobre
esse cenário espalha-se ainda, como uma sombra, o novo moralismo, que carrega o
debate político com discursos de ódio, potencializados, entre outros, pelo
avanço da fração religiosa intolerante e pela falência do sistema educacional.
E a corrupção, sempre a corrupção.
Agora,
protestar contra a corrupção generalizada de olho apenas no Executivo e na
figura da presidente ou é muita ingenuidade política ou faz parte de um jogo
sujo condenável e nocivo ao desenvolvimento da democracia brasileira. Pois é no
Legislativo que estão os principais acusados de tirar proveito dos esquemas de
corrupção. Por que eles não são, também, alvos dos protestos?
Diante
disso, só há uma resposta: Dilma Rousseff venceu eleições livres e diretas. E
não há nenhuma prova de que tenha cometido irregularidades ou enriquecido
ilicitamente.
Isso
não significa que o eleitor deva baixar a cabeça e acatar seu distanciamento de
muitas das promessas que a presidente fez durante a campanha para seu segundo
mandato. É mais que justificado o ímpeto de tomar as ruas para cobrar o que foi
vendido como programa de governo.
No
entanto, o que me parece ser o objetivo oculto desses protestos é reverter o
resultado recente das urnas. Não é para isso que existe o recurso do
impeachment. Esse respeito Dilma merece, como presidente eleita.
Não
esqueçamos que, se hoje todos podem ir às ruas protestar pacificamente, é
porque muitos corajosos, como a própria Dilma Rousseff, lutaram pelo fim da
ditadura militar. Lançar mão de um recurso tão drástico, que desestabiliza as
estruturas democráticas e em última instância pode até expor o país novamente
aos riscos de um golpe de Estado, é um gesto irresponsável, seja por convicção,
seja por mera inocência política.
Texto disponível no site
da CartaCapital: http://www.cartacapital.com.br/politica/impeachment-nao-e-a-resposta-a-atual-crise-1191.html
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