19.5.12

A revista Veja e a insustentabilidade das suas verdades fabricadas


Já faz algum tempo que tento mostrar aos meus interlocutores as maracutaias da revista Veja, porta estandarte das publicações da Editora Abril.
A TV Record e a revista CartaCapital têm demonstrado de forma inequívoca que, além de praticar um jornalismo de péssima qualidade, a publicação com sede na Marginal do Tietê tem enveredado pelo mundo do crime, seja guiada pelo Carlinhos Cachoeira – hoje chamado de bicheiro e criminoso pela mídia, mas até ontem qualificado como empresário do ramo de jogos pela mesma – ou abrindo espaço para o seu sócio, senador Demóstenes Torres.
O impávido senador ocupou as páginas amarelas da porcalhona para detonar o Congresso e seus pares.
A revista articula notas, notícias, reportagens investigativas e outras artimanhas sempre de acordo com os seus interesses mais sórdidos.
Isso a parte da mídia não comprometida com os interesses corporativos do PIG (Partido da Imprensa Golpista, segundo Paulo Henrique Amorim) tem mostrado com sobras.
Hoje tive acesso, por indicação dos amigos virtuais do Twitter, a um artigo demolidor sobre as fraudes e interesses nebulosos da revistinha mais lida do país, mas que é chamada de revista de fofocas pela imprensa internacional.
Trata-se da análise de uma matéria de capa lidando com a delicada questão dos agrotóxicos. O texto é assinado por Elenita Malta Pereira, doutoranda em História na UFRGS. Primeiro li no blog Outras Palavras e depois no Observatório da Imprensa.
Leiam os trechos que selecionei (para ler a matéria na íntegra basta clicar no nome das publicações apontadas acima):

A matéria “A verdade sobre os agrotóxicos”, publicada na Veja (edição de 4/1/2012), revisita um tema que é alvo de polêmicas, oposições apaixonadas e amplas discussões no Brasil desde os anos 1970. No entanto, apesar de décadas de controvérsia, já no título, a revista demonstra que pretende revelar a verdade sobre o assunto. A Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), em carta-resposta à Veja, considerou o tratamento dado a um tema tão controverso como “parcial e tendencioso”, apontando uma série de equívocos na reportagem.
(...)
Motivada pela divulgação, em dezembro de 2011, de um estudo sobre contaminação de alimentos por pesticidas promovido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) referente ao ano de 2010, a reportagem da Veja começa questionando o uso da palavra “agrotóxico”: o “nome certo é defensivo agrícola”. Segundo a matéria, “agrotóxico” é um termo impreciso e carregado de julgamento valor; já “defensivos” seria correto, porque esses produtos não servem para intoxicar o ambiente ou o consumidor, mas para “defender” a plantação de pragas, insetos e parasitas. Esse debate é antigo, construído ao longo de uma verdadeira contenda, que foi protagonizada por ecologistas, políticos e representantes das indústrias agroquímicas, desde os anos 1970. A própria nominação dos agroquímicos determinava de que “lado” estava quem nomeava: de um lado executivos das indústrias fabricantes que, obviamente, queriam vender seus produtos, pesquisadores que recebiam financiamento dessas empresas para suas pesquisas e funcionários públicos, todos trabalhando para “defender” seus interesses. Do outro lado, entidades ambientalistas de vários estados, professores universitários e pesquisadores preocupados com o efeito desses produtos na saúde das pessoas e da natureza.
O termo agrotóxico, mais do que portar um juízo de valor, está consolidado na legislação brasileira sobre o tema, a Lei 7.802/89. A palavra já estava presente na primeira legislação estadual, a Lei 7.747, publicada no Rio Grande do Sul, em dezembro de 1982, fruto de um amplo debate liderado por políticos, pesquisadores e ecologistas. O ecologista José Lutzenberger considerou a publicação dessa lei uma “vitória sem precedentes”, uma conquista da sociedade civil, inédita em diversos países. Por outro lado, o termo “defensivos agrícolas” também não é isento de valor: expressa que essas substâncias são boas, defendem a lavoura de pragas. No entanto, o próprio conceito do que pode ser considerado praga é questionável, depende do ponto de vista de quem está observando uma plantação. O que é praga na agricultura que usa produtos químicos pode ser um aliado no controle natural de insetos realmente prejudiciais, e até mesmo um indicador da saúde das plantas para quem pratica agricultura ecológica.
(...)
A matéria da Veja faz afirmações de forma leviana e irresponsável para a população leiga no assunto, passando a impressão que os agrotóxicos não são tão perigosos assim. Ela diz que os alimentos que lideram o ranking da ANVISA de forma alguma representariam risco à saúde, que os resíduos estão dentro dos níveis seguros e que o uso de agrotóxicos não autorizados não é prejudicial à saúde. Neste último caso, a justificativa seria o alto custo para os fabricantes alterarem os rótulos, indicando outros cultivos onde os pesticidas poderiam ser utilizados. Aqui, podemos perceber mais uma vez que os interesses das empresas sempre são relevantes e merecem ser preservados.
(...)
Consultando os arquivos dos jornais de maior circulação do país, é possível constatar uma quantidade impressionante de notícias sobre envenenamento e morte de agricultores, cuja causa envolveu a aplicação de produtos químicos na lavoura. Há períodos em que as ocorrências são diárias, envolvendo famílias inteiras, em cidades do interior do Brasil. Casos de jovens que dormiram durante meses, sem perspectiva de acordar, depois do contato com agrotóxicos; bebês que ficaram doentes por causa do leite, já que a vaca que o fornecia comeu pasto contaminado com pesticidas; crianças que morreram pela ingestão de água contaminada; agricultores fulminados durante pulverizações aéreas sem aviso prévio, entre outros, são exemplos nefastos de que o equipamento não é garantia de segurança total.
Artigo da Gazeta Mercantil (Porto Alegre, 28/05/1975) relata que o consumo de pesticidas no Brasil aumentou dez vezes entre 1964 e 1974 e questiona: “em que medida esse consumo teria sido fortemente incentivado, provocando o uso indiscriminado e exagerado de defensivos?” Se por volta de 1974 o consumo somava cerca de 74 mil toneladas anuais, o que dizer das cerca de 1 milhão toneladas em 2010 (de acordo com dados do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Agrícola)? O estímulo ao uso intensivo desses produtos interessa aos fabricantes, pelos altíssimos ganhos, mas, ao mesmo tempo, provoca prejuízos não totalmente contabilizados ao ambiente e à vida humana.
(...)
Outra informação da matéria da Veja é que “o Brasil é um dos países mais rigorosos no registro de agrotóxicos”. No entanto, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), nosso país é o principal destino de agrotóxicos proibidos no exterior. Diversos produtos vedados nos Estados Unidos e na Europa são comercializados livremente aqui. Se o controle fosse mesmo rigoroso, o Brasil seria o maior consumidor mundial de agrotóxicos?

A matéria merece ser lida na sua totalidade. Podemos concluir que a Veja não pratica somente um péssimo jornalismo, destituído de ética e valores humanísticos, mas também e principalmente faz uso da canalhice pura e simples.

Um comentário:

Amigos da Rua Gonçalo de Carvalho disse...

Sobre o Dia Mundial do Controle da Poluição por Agrotóxicos: http://goncalodecarvalho.blogspot.com.br/2010/01/dia-do-controle-da-poluicao-por.html