Entenda o que muda com a Venezuela no Mercosul
Alessandra Corrêa
Da BBC Brasil em São Paulo
A Comissão de Relações Exteriores do Senado aprovou nesta quinta-feira o protocolo de adesão da Venezuela ao MERCOSUL. A decisão ocorre depois de meses de discussões entre parlamentares governistas e de oposição.
A matéria já passou pela Câmara. Após aprovação na comissão, deverá ser votada no plenário do Senado.
O protocolo de adesão da Venezuela ao MERCOSUL foi assinado em 2006 e deve ser aprovado por todos os integrantes para que o país se torne um membro integral do bloco.
Argentina e Uruguai já ratificaram o ingresso da Venezuela no MERCOSUL. O Paraguai espera a decisão do Brasil para votar o protocolo.
Abaixo, a BBC Brasil responde a algumas perguntas sobre os impactos da entrada da Venezuela no MERCOSUL.
Que impacto a entrada da Venezuela no MERCOSUL deverá ter no bloco e nas relações com outros países?
Setores contrários à entrada da Venezuela no MERCOSUL afirmam que o governo do presidente Hugo Chávez deixa a desejar em relação ao respeito aos princípios democráticos e que a adesão de seu país pode ser prejudicial ao bloco.
De acordo com analistas consultados pela BBC Brasil, o estilo "personalista" de Chávez pode ser motivo de temor em alguns países da região.
"É um tipo de governo que, de alguma forma, traz outro comportamento para dentro do MERCOSUL", diz Sônia de Carmago, professora da PUC-Rio. Segundo ela, enquanto Lula tem uma atuação "agregadora" em política externa, o presidente venezuelano é mais intempestivo e cultiva um "nacionalismo exacerbado".
José Alexandre Hage, professor de Relações Internacionais da Trevisan Escola de Negócios, questiona ainda como o bloco irá agir diante de problemas que a Venezuela tradicionalmente tem, como os conflitos com a Colômbia.
"Se a Venezuela entra no MERCOSUL, de certa forma estamos corroborando os problemas dela. E a rivalidade que a Venezuela tem com a Colômbia, por exemplo? Como fica o bloco?", questiona.
O discurso antiamericano do presidente da Venezuela também é visto por alguns como um problema, e há o temor de que possa prejudicar as relações do bloco com os Estados Unidos. "Uma alta dose de Chávez no MERCOSUL pode aumentar uma ideologização antiamericana", diz Hage.
Há ainda o temor de que a presença da Venezuela prejudique as negociações para um acordo de livre comércio entre o MERCOSUL e a União Europeia.
No entanto, o argumento dos defensores do ingresso da Venezuela no MERCOSUL é o de que não se pode impedir a entrada do povo venezuelano no bloco devido à atual circunstância política e que deixar o governo Chávez isolado seria pior.
"O problema não é a Venezuela, todo mundo quer que a Venezuela faça parte do MERCOSUL. O problema é o governo Chávez", diz Georges Landau, conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).
A Venezuela deve se beneficiar da integração comercial com o MERCOSUL. De acordo com alguns analistas, também o bloco teria benefícios com o ingresso do país.
"Do ponto de vista de se criar um bloco político mais coeso, a entrada da Venezuela pode ajudar. De certa forma, os países que compõem o MERCOSUL são muito parecidos na essência, com governos de centro-esquerda, com traços de certo nacionalismo. O Chávez é um pouco mais denso nesse nacionalismo, isso pode dar ao bloco um pouco mais de consistência", afirma Hage.
O ingresso da Venezuela no MERCOSUL pode aumentar o poder de influência de Hugo Chávez na região?
Alguns analistas afirmam que o ingresso da Venezuela no MERCOSUL dará a Chávez mais poder de influência na região. O país, que já integra a Alba (Aliança Bolivariana para as Américas) e a Unasul (União de Nações Sul-Americanas), ganharia um palco importante.
"Aumenta o grau de projeção de Chávez, tem muito mais espaço de articulação", diz Hage. "Ganharia um palco muito melhor que Unasul e Alba, que são expectativas, enquanto o MERCOSUL, apesar da crise, realmente existe."
Como os venezuelanos veem a adesão do país ao bloco?
Nesta semana, um dos principais opositores de Chávez, o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, veio ao Brasil e defendeu a aprovação da entrada da Venezuela no MERCOSUL. O líder opositor afirma que o povo venezuelano não pode ser punido com o isolamento por causa do governo Chávez.
Além disso, há a expectativa de que, com a entrada da Venezuela, aumente o poder de pressão do MERCOSUL sobre o governo Chávez, para que cumpra pré-requisitos democráticos. Em uma audiência no Senado, Ledezma disse que a adesão da Venezuela ao MERCOSUL seria uma chance de "enquadrar" Chávez.
O Protocolo de Ushuaia, parte do Tratado de Assunção, que criou o MERCOSUL, afirma que "a plena vigência das instituições democráticas é condição essencial para o desenvolvimento dos processos de integração" do bloco. Em caso de não cumprimento das cláusulas democráticas, um país pode sofrer suspensão.
"A Venezuela é uma democracia em termos formais, mas tem uma forma de governo muito autoritária", diz Sonia de Camargo.
No entanto, alguns analistas afirmam que os resultados práticos desse tipo de pressão por parte do MERCOSUL podem ficar aquém do esperado. "Não há mecanismos para isso, porque o MERCOSUL é muito pouco institucionalizado", diz Hage.
Apesar das limitações, alguns defensores do ingresso da Venezuela no MERCOSUL afirmam que é melhor ter o país no bloco, atendendo a algumas regras, do que independente e sem controle.
Qual o impacto econômico da adesão da Venezuela ao MERCOSUL?
No ano passado, a balança comercial do Brasil com a Venezuela alcançou US$ 5,7 bilhões, com superávit de US$ 4,6 bilhões para o Brasil.
Desde 2007, o Brasil passou a ser o segundo sócio comercial do país, ficando atrás somente dos Estados Unidos, principal consumidor do petróleo venezuelano.
A Venezuela importa 70% do que consome, a maior parte da Colômbia e dos Estados Unidos. Defensores afirmam que o ingresso do país no MERCOSUL traria vantagens econômicas e fortaleceria o PIB do bloco. Também estenderia o bloco para o norte da América do Sul, com influência na região caribenha e benefícios para os Estados da região norte do Brasil.
Para fazer parte do MERCOSUL, a Venezuela tem de cumprir critérios, entre eles a adoção da Tarifa Externa Comum (TEC), vigente no comércio do bloco. Críticos afirmam que a Venezuela ainda não cumpriu esses critérios e não aceitou o tratado de tarifas comuns com terceiros países.
Nenhum comentário:
Postar um comentário