8.6.08

Editorial da Folha de S.Paulo sobre a Amazônia

O editorial da Folha de S. Paulo de hoje (08/06) é bem equilibrado ao tratar de um problema que têm movimentado brasileiros e estrangeiros: a questão amazônica.
A discussão frequentemente extrapola o bom senso e, quase sempre, ignora o bem estar e o desenvolvimento local.
Aproveitar os institutos de pesquisa do norte do país, somar a eles uma gama de recursos compatíveis com a grandeza e as potencialidades da floresta, poderia ser um caminho adequado para eliminar as especulações internacionais.
O que não pode é deixar para os grileiros e o “agrobanditismo”, que conjugados destroem tanto a natureza quanto a cultura e as populações locais.
Embora conservadora no trato das questões econômicas a Folha tem demonstrado acerto no trato das questões amazônicas e indígenas.
A leitura é merecedora de reflexão.

A hora da Amazônia
Tecnologia e conservação deveriam nortear um novo modelo para desenvolver a região que ocupa metade do Brasil

O DESMATAMENTO da Amazônia, além de estar no fulcro da imagem brasileira no exterior, desperta repúdio generalizado na opinião pública nacional. Após cinco séculos de crescimento com dilapidação de capital natural, o país enfim se dá conta de que seu futuro depende de uma guinada na marcha sobre a floresta, "a ferro e fogo".
O desafio está não tanto em conciliar desenvolvimento com preservação ambiental, dicotomia ultrapassada, mas em casar sustentabilidade com tecnologia. Assim será possível reverter em benefício da população amazônica e do país, hoje e para futuras gerações, a exploração de um dos maiores acervos de recursos naturais estratégicos.
A virtual unanimidade em favor de preservar os mais de 80% de floresta amazônica remanescente, contudo, não implica clareza sobre os meios de realizar o objetivo. Cabe ao governo federal arbitrar os interesses em jogo. Com o momento adquirido pela questão amazônica, é hora de formular uma política ousada para a região que cobre mais da metade do Brasil.
Começa a esboçar-se algo próximo de um consenso quanto às linhas gerais de um programa que não se reduza a uma lista de obras. O primeiro obstáculo a superar é a reticência do presidente Lula em assumir um compromisso concreto com a progressiva redução do desmatamento.
Só uma tal meta de Estado, vinculada a prazo definido, porá termo à ambigüidade da política ambiental. Seria factível estabilizar a taxa de desmatamento, até 2015, no patamar máximo de 10 mil km2 anuais, próximo do que se obteve em 2007. Além disso, investir cerca de R$ 1,5 bilhão anual para recuperar 150 mil km2 em dez anos.
A soma é alta, mas compatível com a capacidade de financiamento do Estado brasileiro. Basta mencionar que a cada ano valores similares são lançados em multas ambientais nunca arrecadadas. Caberia priorizar sua cobrança, focalizando as de maior valor e potencial para produzir efeitos demonstrativos.
O nó górdio da destruição reside na questão fundiária. Apenas 4% das terras na região são áreas privadas com títulos validados; outros 43% correspondem a unidades de conservação e terras indígenas. Do restante, 1 milhão de km2 (21% do total) são áreas supostamente públicas, as quais urge mapear e inscrever no patrimônio da União.
Há ainda 1,6 milhão de km2 (32%) de terras alegadamente privadas. Estima-se que um terço -420 mil km2, o equivalente a meio Mato Grosso- seja de posses ilegais. O governo federal deveria regularizá-las, mas só até o limite de 500 hectares e contra pagamento, para não premiar a grilagem.
O zoneamento ecológico-econômico constitui ferramenta importante para disciplinar o uso da terra, mas é ilusório aguardar que abranja os 5 milhões de km2 da Amazônia Legal. Cumpre priorizar regiões onde avança a fronteira agrícola. Como princípio geral, impõe-se circunscrever a agricultura intensiva e a pecuária às áreas já desmatadas.
Do governo federal se exige ainda que aprofunde o uso do crédito como alavanca para forçar o cumprimento de mínimos padrões fundiários, ambientais e trabalhistas. Não faltam fontes como fundos constitucionais para fomentar atividades de extrativismo de baixo impacto. É urgente financiar mais estudos para conceder a exploração de florestas públicas à iniciativa privada.
A revolução amazônica dependerá também de forte influxo de conhecimento. O governo deveria encampar a proposta da Academia Brasileira de Ciências de investir R$ 30 bilhões até 2018 em pesquisa aplicada na região. O objetivo seria criar cadeias produtivas de alta tecnologia e elevado valor agregado, capazes de atrair capital privado.
O modelo de desenvolvimento para o trópico florestal ainda está por ser inventado. Mais que um fardo, isso representa para o país uma grande oportunidade.


Fonte: Folha de S.Paulo – 08/06/08.

Um comentário:

Lola disse...

Olá,
Tanto a matéria, quanto a postagem estão ótimas, parabéns!
O que falta no momento é disposição dos governantes para começar a agir, de promessas ninguém vive. Espero que o Brasil não precise levar um susto (MAIOR)para começar a reagir...

Parabéns pelo blog.
Beijo.