9.8.07

Sobre a deserção dos atletas cubanos

Em todas as competições internacionais de renome alguns atletas cubanos pedem asilo político, deixando o seu país e o seu povo.
Os motivos são muitos, alguns compreensíveis, outros menos, mas é sempre a possibilidade de ganhar dinheiro e melhorar de vida que os move.
Quanto a este aspecto só mesmo conhecendo um pouco de Cuba para emitir juízo de valor.
Lembro-me sempre de uma frase de um amigo cubano sobre a Ilha: – “Aqui não passamos necessidades, mas não conseguimos suprir nossos desejos. Tê-los é legítimo, mas temos que fazer opções, eu optei pela revolução.”
Por isso não me causa estranheza alguma a “fuga” dos 4 cubanos nestes Jogos Pan-Americanos.
Um está instalado confortavelmente em São Caetano, com contrato assinado com o time de Handebol local. Não foi preso pela polícia, não foi deportado, enfim, parece que tudo está saindo como ele planejou.
Já os dois boxeadores não tiveram a mesma sorte. Parece que o plano azedou no meio do caminho.
Tudo indica que Erislandy Lara e Guillermo Rigondeaux foram aliciados por alemães que atuam no mercado das lutas profissionais e, não sabe a razão, de repente a coisa azedou.
Claro que a oposição já está de pedras nas mãos contra a Polícia Federal e o Governo Lula, acusando-os de facilitar a deportação dos cubanos e mais, de terem agido em acordo com o governo cubano.
Abaixo transcrevo parte de uma matéria da Folha de S. Paulo de ontem, de autoria do repórter Sérgio Rangel:

Dono da Estalagem Pirata, Reinaldo Sá Forte disse ontem não acreditar que os boxeadores cubanos foram presos pelos policiais militares na tarde do dia 2 em Araruama (115 km do Rio). O proprietário da pousada afirmou acreditar que os atletas pediram ajuda aos policiais para voltarem ao país.
... "Eles eram bem discretos. Na quinta, os dois saíram para almoçar e voltaram com a polícia. Em nenhum momento os policiais disseram que os cubanos tinham sido presos. Eles chegaram sem algemas, foram aos seus quartos, pagaram a conta daqui e foram embora com os policiais. A impressão que tive era que os dois queriam voltar para casa. Até as malas deles já estavam prontas. Na verdade, eles se entregaram", disse Forte...
... Na quinta, o delegado-chefe da Polícia Federal de Niterói, Felício Laterça, disse que a dupla de cubanos havia sido detida por policias militares por não terem nenhum documento. Dois dias depois, os dois seguiram para Cuba num avião fretado pelo governo local. Neste período, os boxeadores não deram entrevista.
De acordo com Laterça, os cubanos se recusaram receber o status de refugiado do governo brasileiro.
Clique aqui para ler a reportagem, mas só para assinantes da Folha ou do UOL.
Já em editorial do mesmo dia, 9/8/07, a mesma Folha desanca o governo (clique aqui, também só para assinantes). Segue um trecho:

Direitos nocauteados
Deportação de dois boxeadores cubanos pela administração Lula é um desrespeito ao princípio de asilo político
... Existe a possibilidade teórica de que tudo não tenha passado de uma operação rotineira de repatriamento. Esse seria o caso se os atletas cubanos de fato desejavam voltar para seu país, como alegam as autoridades brasileiras. As circunstâncias da deportação, entretanto, fazem dessa hipótese uma espécie de conto da carochinha.
Impressiona, em primeiro lugar, o açodamento da operação. Depois de desertar da delegação cubana no meio dos Jogos Pan-Americanos, os pugilistas foram detidos na sexta-feira no litoral do Rio de Janeiro por estar sem documentos. ... Foram mantidos incomunicáveis e, no domingo, já se encontravam em Havana, aonde chegaram num vôo especialmente fretado. Logo foram enfiados numa "casa de visita", eufemismo da ditadura cubana para prisão.
O mínimo que se esperava do Ministério da Justiça e do Itamaraty é que honrassem a tradição brasileira de concessão de abrigo a perseguidos políticos e dessem aos pugilistas o tempo e a oportunidade para decidir livremente se queriam retornar à ilha ou requerer o asilo. Isso exigiria colocá-los em contato com representantes de instituições independentes, como a Comissão de Justiça e Paz da CNBB, a OAB, o Ministério Público ou a própria ONU, que poderiam apresentar-lhes alternativas e prestar esclarecimentos. Se tais entrevistas tivessem ocorrido, ao menos não haveria dúvidas quanto à real disposição dos atletas de voltar... Sejam quais forem os desígnios e as maquinações por trás desse caso, é fato inconteste que o governo Lula errou. Na hipótese benigna, falhou ao imprimir à deportação velocidade olímpica, permitindo que se levantassem dúvidas quanto às reais intenções dos atletas. A outra possibilidade, mais verossímil, é escandalosa: a administração petista colocou o aparato policial do Estado brasileiro a serviço de uma ditadura estrangeira. ...

Um comentário:

Vera Pereira disse...

Veja no blog do Alon um excelente comentário sobre entrevista do ex-chanceler brasileiro Celso Lafer.